domingo, 1 de junho de 2014

Infecções de vias aereas superiores

As infecções das vias aéreas superiores (IVAS) são seguramente as causas mais freqüentes de atendimentos pediátricos, tanto em prontos-socorros como em consultórios. Elas compreendem as rinofaringites, otites, sinusites e laringites.
                  São infecções que apresentam características comuns quanto à etiologia, faixa etária, sazonalidade e prognóstico. Quanto à etiologia, a grande maioria é provocada por agentes virais. Acometem principalmente as crianças entre seis meses e cinco anos de idade, com pico de incidência no outono e inverno e prognóstico favorável, sem complicações, na imensa maioria dos casos.
                 As IVAS apresentam, ainda, em comum alguns fatores predisponentes, como escolaridade precoce, alergia respiratória e prática de aulas de natação. A escolaridade precoce, a partir do quinto mês de vida, confina crianças suscetíveis e em fase de imunidade recebida da mãe em seu mais baixo nível, em ambientes de grande concentração de agentes virais e bacterianos. A alergia respiratória leva a inflamação e formação de muco, diminuindo as defesas locais das mucosas das vias aéreas e favorecendo a colonização das mesmas pelos agentes infecciosos.
                 A natação, indicada indiscriminadamente, sem nenhum tipo de critério, devido ao poder irritante do cloro sobre a mucosa, pode levar a um agravo da alergia respiratória, com conseqüente facilitação da instalação do processo infeccioso. Além desse fato, há ainda que levar em conta o choque térmico a que a criança muitas vezes é submetida, com conseqüente queda das defesas locais das mucosas e maior risco de instalação do processo infeccioso.

Rinofaringite

O termo rinofaringite é empregado, principalmente, em substituição a "resfriado comum". A infecção que afeta a rinofaringe é a mais freqüente em lactentes e crianças maiores, daí sua importância na prática pediátrica.

Etiologia 
A rinofaringite é entidade infecciosa produzida por vários tipos de vírus entre os quais podemos citar: influenza, adenovírus, parainfluenza, rinovírus e outros. A fase purulenta, secundária, é produzida por bactérias invasoras, sendo as mais freqüentes o pneumococo, os estreptococos hemolíticos, o Haemophilus influenzae e os estafilococos.

Quadro clínico 
O quadro clínico varia do lactente para a criança maior. Nos dois primeiros anos de vida a febre é sintoma predominante. A coriza está sempre presente, sendo hialina na fase inicial e podendo transformar-se em purulenta na fase final. Tosse e mal-estar, com irritabilidade e anorexia, completam o quadro, que evolui, quando não complicado, para a cura em três a cinco dias. Na criança maior o quadro é praticamente o mesmo, apenas a febre é que pode estar ausente ou, então, temos apenas um estado subfebril.

As complicações mais freqüentes são a otite média aguda, as bronquites e broncopneumonias e as sinusites agudas.

Tratamento 
O tratamento é totalmente sintomático, não havendo necessidade de utilização de antibióticos
, a não ser em casos com as complicações acima citadas. Utiliza-se o ácido acetilsalicílico para a febre, na dosagem de 50 a 70 mg/kg/dia, fracionado em quatro tomadas. Para a coriza se usa solução fisiológica instilada freqüentemente, duas a três gotas em cada narina, e nos casos de muita obstrução nasal e que causem muito desconforto à criança se emprega amoximetazolina 0,025%, no máximo três vezes ao dia.

Faringites  agudas

As infecções agudas da faringe não são muito habituais no primeiro ano de vida, mas ocorrem, a partir daí, com bastante freqüência.

Etiologia 
Antigamente se acreditava que todas as infecções da faringe eram provocadas por bactérias, principalmente o estreptococo hemolítico do grupo b. Atualmente estudos epidemiológicos e microbiológicos demonstram que agentes virais estão envolvidos em grande número de faringites, sendo seus principais causadores.

Quadro clínico 
A faringoamigdalite bacteriana é quadro agudo, com temperatura elevada (39 a 40oC), sendo que nas primeiras 24 horas praticamente não existem sinais ou sintomas faríngeos. Ao fim do primeiro dia começam a surgir os sinais de comprometimento faringoamigdaliano, com ardor e dor à deglutição. O aspecto local varia desde moderada congestão faringoamigdaliana até aspecto bastante avermelhado, com edema e lesões exsudativas, tanto da faringe como das amígdalas.

O quadro clínico da faringoamigdalite não bacteriana se apresenta como sintomatologia mais leve, com ardor e dor faríngea desde o início, bem como a duração dos sintomas é bem mais curta e quase sempre acompanhada de rinorréia e afonia. Apesar disso, o diagnóstico diferencial entre um quadro e outro só pode ser efetuado mediante culturas bacterianas e outras análises que permitam evidenciar a presença de agente viral.

As complicações mais freqüentes da faringoamigdalite são as linfadenites cervicais e otites médias; menos freqüentes são os abscessos amigdalianos e as pneumonias.

Tratamento 
O tratamento específico consiste na administração de antibioticoterapia, a saber:

1. Penicilina benzatina IM, 50.000 U/kg em dose única;
2. Eritromicina 50 mg/kg/dia, via oral em 4 tomadas, por 7 a 10 dias em pacientes alérgicos à penicilina.
Além disso, usar antitérmico, ácido acetilsalicíclico 50 a 70 mg/kg/dia, em quatro tomadas.

Otite média aguda

As otites médias agudas são afecções freqüentes nas crianças entre 0 e 4 anos de idade, havendo depois dessa fase um decréscimo significativo em sua incidência.

Na grande maioria dos casos são processos infecciosos bacterianos e que surgem em conseqüência de infecções virais da rinofaringe. Podem ocorrer casos esporádicos em que o processo viral inicial não está presente, como acontece em lactentes jovens submetidos a posições errôneas de aleitamento e, menos freqüentemente, em casos de infecção bacteriana isolada do ouvido médio.

Etiologia 
Os agentes infecciosos causadores da otite média aguda na criança são, em ordem de freqüência, o pneumococo, Haemophilus influenzae (capsulado ou não) e a Moraxella catharralis.

Quadro clínico 
A otite média aguda, como o próprio nome indica, é um quadro agudo de início abrupto, caracterizado por dor intensa na orelha acometida, sendo de fácil identificação em crianças que falam e caracterizando-se por choro estridente e sem acalmia, em lactentes. Na imensa maioria das vezes é doença febril e atinge a criança durante ou imediatamente após um quadro de infecção viral da rinofaringe. A dor é provocada pela formação de um verdadeiro abscesso no ouvido médio, que por vezes rompe a membrana timpânica, drenando através do conduto auditivo e levando à chamada otite média supurada.

O diagnóstico é suspeitado pela história clínica e confirmado pela otoscopia que revela hiperemia do conduto auditivo, hiperemia e abaulamento da membrana timpânica e, nos casos de supuração, mostra saída de pus através do conduto auditivo.

Tratamento 
O tratamento da otite média aguda compreende atender a dor do paciente, que é intensa, bem como o tratamento etiológico, a fim de resolver o processo. Para atender à dor usamos analgésicos, como paracetamol ou dipirona, bem como realizamos compressas quentes secas no ouvido, com resultado bastante satisfatório. O tratamento etiológico é por nós iniciado com o uso da amoxicilina, uma vez que o principal agente causal é o pneumococo e, no caso do hemófilos, a grande maioria é não capsulado e, portanto, com resistência bem menor aos derivados da ampicilina.

Em casos de otites médias recidivantes ou naquelas cuja resposta terapêutica não é satisfatória, podendo sugerir a presença da moraxela, usamos a associação amoxicilina/clavulanato ou amoxicilina/sulbactam ou, então, uma cefalosporina de segunda geração, como o cefaclor. Gotas otológicas somente são indicadas em caso de supuração e enquanto esta perdurar. O uso de descongestionantes nasais sistêmicos, bem como de corticosteróides é extremamente controvertido, embora seja defendido por alguns otorrinolaringologistas.

Mastoidite

Mastoidite é uma infecção supurativa das células aeradas da mastóide. É potencialmente uma complicação de todos os casos de otite média, devido à continuidade da linha mucoperiostal da mastóide com aquela do ouvido médio. A doença mastoidite pode ser assintomática, com resolução espontânea, chegando até doença progressiva grave, mesmo com tratamento. Com o advento da antibioticoterapia no tratamento dos processos infecciosos auditivos, houve uma diminuição muito grande na freqüência da mastoidite, fato que tornou os pediatras menos capazes de fazer seu diagnóstico.

Etiologia 
Os agentes etiológicos mais freqüentemente envolvidos na mastoidite são, em primeiro lugar, o Streptococcus pyogenes (estreptococo hemolítico do grupo A); o S. pneumoniae (pneumococo) é o segundo mais freqüentemente isolado e em terceiro lugar vem o Staphylococcus aureus. O H. influenzae é muito menos isolado nos casos de pacientes com mastoidite e otite média do que quando só existe infecção do ouvido médio.

No caso de mastoidite crônica muda o quadro bacteriológico, sendo, por ordem de freqüência, mais comumente encontrados o S. aureus e bacilos gram-negativos, em particular Pseudomonas aeruginosa e, menos freqüentemente, organismos anaeróbios.

Quadro clínico 
O quadro clínico da mastoidite, na grande maioria das vezes, é representado por uma doença febril aguda, dor de ouvido, na grande maioria dos casos com otite média aguda. Após dias, às vezes semanas, do início desse quadro surgem na região retroauricular, descendo até a apófise mastóide, edema, calor e rubor de extensão variável.

Dentre as complicações mais freqüentes provocadas pela mastoidite, podemos citar: abscesso subperiostal, paralisia facial, meningite, abscesso cerebral, empiema subdural, tromboflebite dos seios venosos, osteomielite do temporal e perda de audição.

Diagnóstico 
O diagnóstico da mastoidite é baseado principalmente nos dados clínicos e auxiliado por radiografia específica. Atualmente, a tomografia computadorizada tem sido o exame de escolha dos especialistas, visando confirmar o diagnóstico clínico de mastoidite. A cintilografia com tecnésio não é indicada de rotina, mas pode ser utilizada em casos de dúvida.

Tratamento 
Utilizamos a antibioticoterapia empírica, visando cobrir todos os principais agentes causadores de mastoidite. Assim sendo, utilizamos uma associação de oxacilina e ceftriaxone, nas dosagens de 200 mg/kg/dia e 100 mg/kg/dia, respectivamente. A duração do tratamento nunca é inferior a 14 dias, podendo inclusive prolongar-se por mais tempo.

A necessidade de drenagem cirúrgica deve sempre ser avaliada conjuntamente com o especialista.

Nos casos de mastoidite crônica usamos duas associações: clindamicina (50 mgkg/dia) e ceftriaxone, a fim de cobrir, inclusive, a possibilidade de agente anaeróbio, sendo que nesses casos devemos considerar a eventual substituição do ceftriaxone pela associação ceftazidime (100 mg/kg/dia) e amicacina (15 mg/kg/dia) em caso de suspeita de Pseudomonas aeruginosa.

Sinusites

As sinusites agudas são patologias infecciosas bacterianas dos seios paranasais. Elas eram muito pouco diagnosticadas há 10 ou 15 anos, sendo naquela época até questionada sua existência. Dessa época para cá com o avanço dos meios diagnósticos, seu diagnóstico passou a ser feito com mais freqüência e hoje o que se vê é que a sinusite é superdiagnosticada em Prontos-Socorros de Pediatria, seguramente muitas vezes erroneamente e com prejuízo para o paciente. Como veremos, a sinusopatia pressupõe, primeiro, seios aerados para ocorrer e, em segundo lugar, apresentar clínica e não deve basear-se exclusivamente em um achado radiológico.

Desenvolvimento dos seios paranasais 
Os seios etmoidais se localizam em ambos os lados da linha média do osso etmóide, que se apresenta limitado lateralmente pela órbita, fato esse que permite a extensão da etmoidite até a região periorbitária. Eles apresentam aeração parcial já ao nascimento.

Os seios maxilares ao nascimento estão pouco aerados, apresentando uma aeração mais diferenciada a partir do segundo semestre de vida e vão completando-se a partir do quarto ano de vida.

O seio frontal está presente ao nascimento, mas não se acha aerado, fato esse que só ocorrerá a partir do oitavo ano de vida.

Os seios esfenoidais apresentam desenvolvimento lento e, por serem isolados, ficam preservados de infecções freqüentes. Sua aeração só se inicia em torno do terceiro ou quarto ano de idade.

Patogênese 
Acredita-se que a obstrução dos óstios de drenagem seja a primeira manifestação a ocorrer nas sinusites. Por isso, na maioria das vezes, a rinite ou resfriado comum precedem, invariavelmente, a instalação de uma sinusite.

Etiologia 
A etiologia das sinusites é semelhante à das otites, sendo representado pelo pneumococo, Haemophilus influenzae (capsulado ou não), Moraxella catarrhalis, Streptococcus pyogenes, e muito raramente anaeróbios.

Nos quadros de sinusite que se cronificam a ordem de freqüência se modifica, passando a etiologia a ser representada por Streptococcus alfa-hemolitico, Stafilococcus aureus, Moraxella catarrhalis e, por último, pneumococo e Haemophilus influenzae.

Quadro clínico 
O quadro clínico das sinusites é definido pela sua patogenia, obstrução de vias de drenagem e formação de secreção mucopurulenta que passa a ser eliminada. Por isso, na grande maioria dos casos, temos tosse produtiva, principalmente noturna, impedindo a criança de dormir e secreção mucopurulenta nasal constante, principalmente pela manhã. A febre nem sempre está presente e, portanto, sinusite não é diagnóstico diferencial de febre de algumas horas e sem achados clínicos. Em lactentes com etmoidite poderemos ter o edema periorbitário, devido à contigüidade com a órbita como único sinal da doença. A célebre cefaléia só ocorre após os oito anos, pois é só nessa época que o seio frontal se pneumatiza e podemos ter sua infecção.

Assim, vemos que sinusite tem clínica, tem epidemiologia e tem sinais clínicos, não sendo diagnosticada com base exclusivamente em febre ou em um achado radiológico que poderá apenas significar uma infecção pregressa, já curada, mas ainda sem a restituição total da aeração do seio em questão.

As complicações mais freqüentes e graves das sinusites são as celulites periorbitárias pós-septais e a propagação intracraniana da infecção, podendo ocorrer meningite, empiema subdural, abscessos parenquimatosos e a mais temida, trombose do seio cavernoso.

Diagnóstico 
A suspeita clínica deve ser confirmada através do RX, realizado por técnico experiente; caso contrário teremos muita margem de erro, dado que existem posições específicas para se visualizarem os seios da face. Deve-se, também, levar em conta a época de pneumatização dos seios, para não incorrer em erros. A tomografia é o método de escolha para confirmar o diagnóstico de sinusite, mas, dado seu alto custo, só deverá ser realizado em casos de muita dúvida.

Tratamento 
O tratamento da sinusite aguda é feito com antibioticoterapia, semelhante à usada na otite média, uma vez que os agentes são praticamente os mesmos. O que muda e é importante é a duração do mesmo, que não deve ser inferior a 15 dias. Muitos dos insucessos no tratamento das sinusites ocorrem por serem curtos, levando às vezes à cronificação do processo. Nos casos crônicos, a duração da terapêutica se estende por três a quatro semanas e, nos casos em que haja suspeita de anaeróbio, deve-se associar a clindamicina.

A exemplo do que ocorre na otite média aguda, o tratamento com descongestionantes (tópicos ou sistêmicos), bem como o uso de corticóide, é controverso.

Laringites

As infecções agudas da laringe têm importância pela freqüência com que acometem as crianças, principalmente os lactentes, e pelo risco potencial de levar a insuficiência respiratória obstrutiva aguda, com risco de vida.

Laringite estridulosa
A laringite estridulosa acomete preferencialmente crianças de um a cinco anos de idade. Geralmente é precedida por um resfriado comum, mas na verdade sua etiologia é desconhecida, admitindo-se principalmente o comprometimento alérgico, pessoal ou de familiares. Ela é sazonal e ocorre com freqüência nos meses de inverno, principalmente em noites com queda brusca de temperatura e quetenham sido precedidos por um dia mais quente.

O quadro é agudo e se instala em criança previamente hígida e que acorda no meio da noite com estridor, cornagem, dificuldade respiratória e tosse rouca, envoluindo afebril. Após algumas horas o processo regride e a criança se encontra novamente bem.

A conduta nesses casos, embora controversa na literatura, que acredita na remissão espontânea, é o uso de vapor quente e corticoterapia, tentando evitar o edema de glote e a necessidade de intubação e/ou traqueostomia. Raramente há necessidade de recorrer ao uso de adrenalina, por via inalatória ou subcutânea.

A doença evolui em surtos, recidivando a cada ano por uma a três vezes, até que, por volta de cinco anos de idade, o processo desaparece definitivamente.

Laringite viral
A laringite viral é a forma mais comum de acometimento da laringe em crianças e se inicia, geralmente, por um quadro respiratório mais alto que depois acomete a laringe e também a traquéia. É a causa mais comum de obstrução respiratória alta na infância, sendo que em torno de 5% a 10% dos casos necessitam de hospitalização e desse número de 1% a 2% necessitam de intubação.

Etiologia 
Os agentes mais comuns são os vírus parainfluenza tipo I e II e, ocasionalmente, os vírus influenza A e B e o vírus sincicial respiratório.

Quadro clínico 
O quadro se inicia como um resfriado comum, com tosse seca, febre e rinorréia hialina; com a evolução surge a tosse rouca, pelo edema inflamatório das cordas vocais. Surgem o estridor, a cornagem e obstrução alta, que será tanto mais grave quanto menor for a idade da criança, dado o menor calibre da laringe.

Tratamento 
Apesar da eterna controvérsia, a partir da década de 80 a literatura mostra o benefício para o paciente na utilização da terapia com corticóide por via sistêmica, tanto dexametasona quanto prednisolona, sendo que o emprego precoce dessas drogas reduz o número de pacientes que necessitam de UTI e ventilação assistida.

Epiglotite aguda

É um processo infeccioso da epiglote e dos tecidos vizinhos, de instalação abrupta e rapidamente progressiva, constituindo-se em emergência médica, pelo risco de obstrução respiratória, que pode levar à morte.

Acomete crianças de dois a cinco anos de idade, com pico em torno de 3,5 anos.

O agente etiológico é o Haemophilus influenzae capsulado do tipo b, sendo uma doença que se instala através de bacteremia.

O quadro clínico é febril, agudo, não há pródromos de infecção de rinofaringe, ocorrendo rapidamente dor à deglutição, estridor, cornagem e letargia, o que dá à doença o motivo para ser chamada "falso crupe". Por vezes, na fase inicial, ao examinarmos o "cavum" podemos ver a epiglote edemaciada, com coloração vermelho intenso e brilhante.

Quando a criança nos chega em fase mais avançada ela se acha irritada, com a boca aberta, sialorréia intensa e a expressão ansiosa, com o pescoço estendido e a cabeça inclinada para frente. Deve-se colher hemocultura, que apresenta em torno de 50% a 80% de sensibilidade, para confirmar o diagnóstico.

Tratamento 
É consenso que na suspeita de epiglotite deve proceder-se a intubação a fim de preservar a via respiratória e a vida do paciente. A seguir se inicia a antibioticoterapia, hoje instituindo-se o ceftriaxone, que é uma cefalosporina de terceira geração, uma vez que não há descrição na literatura de Haemophilus influenzae tipo b resistente a ela.

Com o tratamento, geralmente o paciente é extubado em 48 a 72 horas e recebe a antibioticoterapia por sete a dez dias, com recuperação total.

Leucemias e linfomas

Classificação do leucócitos

                            Os leucócitos são divididos em granulócitos (neutrófilos, eosinófilos e basófilos) e agranulócitos (linfócitos e monócitos). O seu número varia com a idade, sexo e condições fisiológicas. No adulto normal é de 6000 a 10000/µl. Têm como função geral a defesa humoral e tecidular e podem migrar através da parede dos capilares. Todos os leucócitos exibem movimentos ameboides, que lhes permitem migrar para dentro e para fora (diapedese) do sistema circulatório e pelos tecidos.
 Os neutrófilos possuem núcleo trilobular e tem a função de fagocitose. Os eosinófilos possuem núcleo bilobular, são também células fagocitárias que atuam em processos alérgicos e parasitoses intestinais. Os basófilos são células com grânulos mais grosseiros que liberam histamina e heparina. Os linfócitos são células mononucleadas com núcleo grande dividida em : linfócito T citotóxico, linfócitos T auxiliares, linfócitos T supressores e linfócitos B. Os monócitos são células com núcleo em forma de rim que se convertem nos tecidos em macrófagos, células fagocitárias.

Granulopoiese

                Consiste no desenvolvimento dos leucócitos dentro da medula óssea. Da mesma forma que os eritrócitos a medida que essas células de diferenciam elas reduzem seu diâmetro.
Mieloblasto     promielócito       meilócito    metamielócito         bastões
                                                                                                             Segmentados
Linfopoiese

É caracterizada por apenas dois estágios precursores: linfoblasto, pro-linfócito e linfócito maduro. A principal característica da linfopoiese é uma diminuição progressiva do tamanho da célula. 
Trombopoiese
As plaquetas derivam na unidade formadora de megacariócitos e a sua formação inclui a seguinte sequência: megacarioblasto, pró-megacariócito, megacariócito e plaquetas.
Leucemia mielóide aguda (LMA)
                É a leucemia mais comum, afetando uma faixa etária bastante ampla. É uma doença maligna, caracterizada pela rápida proliferação de blastos, acumulando-se na medula óssea e impedindo a produção normal de outras células sanguíneas.
                Embora rara (1,2% de óbitos por doenças hematológicas nos EUA), é o principal tipo de leucemia aguda afetando adultos (80% dos casos) e raramente ocorre em crianças. Tem ligeira preferência pelo sexo masculino.
Mecanismos envolvidos na etiologia
                Sabe-se que na maioria das neoplasias há expressão de um ou mais oncogêneses (porções do DNA responsáveis pelo bloqueio da apoptose). Normalmente esses oncogêneses estão localizados em regiões inativas dos cromossomos. Contudo mutações podem ativar esses genes e suprimir anti-oncogêneses. As alterações cromossomais mais importantes na LMA são as translocações e inversões.
                Os mecanismos envolvidos são os seguintes: ativação de gens anormais por translocação de cromossomos ou outras anormalidades genéticas. A maior parte dos pacientes não tem fator de risco identificável. Os fatores congênitos que podem contribuir para o aparecimento da doença são: Síndrome de Down, neutropenia congênita, anemia de Falconi (patologia autossômica recessiva associada a instabilidade cromossômica, caracterizada por heterogeneidade fenotípica, que inclui falência medular, múltiplas malformações congênitas, predisposição para o desenvolvimento de leucemia mielóide aguda (LMA) e hipersensibilidade celular a agentes formadores de ligações cruzadas de ADN), neurofibromatoses.
A presença de doenças hematológicas prévias como síndrome mielodisplasica (mais frequente em idosos), anemia aplástica, policitemia vera, hemoglobinúria paroxística noturna, predispõe também ao surgimento dessa patologia. Fatores ambientais como exposição a radiação ionizante, tabagismo, benzeno e outros solventes e quimioterapia prévia. Porém, na maioria das vezes não existe um fator identificado.
Fisiopatologia
                Os miloblastos tem a função de formarem os glóbulos brancos. Um mieloblasto normal induz a maturação dos leucócitos. Na LMA um único mieloblasto anormal mantém os demais leucócitos em seu estado imaturo, impedindo a maturação celular. Associado a isto estão às mutações que impedem o controle da proliferação celular. Ocorre também um impedimento da apoptose, produzindo o acumulo dessas células na medula (acumulo de blastos). A proliferação excessiva dessa resulta em redução da produção de eritrócitos, leucócitos normais e plaquetas, pela falta de espaço medular. As consequências disso são anemias pela eritropenia, sangramentos devido à plaquetopenia e risco aumentado de infecções devido as lecocitoses a custa de blastos (apesar do aumento de meiloblastos estes são imaturos e não conseguem promover a proteção ao organismo).
Apresentação clínica
                A tríade sintomática da leucemia aguda é: astenia (fraqueza), hemorragia e febre (todos sintomas relativos a insuficiência hematopoiética medular). São sintomas também encontrados na anemia aplástica e, por isso essa deve ser considerada como diagnóstico diferencial. Além dessa tríade encontra-se: palidez (devido a anemia), sangramento gengival, metrorragia, hematomas ou outros sangramentos (devido a plaquetopenia, as vezes a diátese hemorrágica é desproporcional ao grau de plaquetopenia, devido a disfunção plaquetária). Infecções (devido a não diferenciação dos blastos), dores ósseas (expansão da medula óssea pelo processo leucêmico). Em caso de febre deve-se sempre pensar em infecção ou em neoplasia. Se os neutrófilos <1000 indica uma neutropenia grave e nesse caso deve-se usar ATB de amplo espectro. Hepatoesplenomegalia ou adenomegalias são raros.
                Quando a leucometria alcança valores muito elevados, acarretando hiperleucocitose pode ocorrer aumento da viscosidade sanguínea e os leucócitos podem aderir ao endotélio das veias pulmonares e de outros órgãos, gerando sintomas neurológicos (cefaleia, borramento visual, parestesias, torpor, coma, crise convulsiva), pulmonares e genito-urinários. Esta é chamada de crise leucostase. OBS: quando os blastos estão presentes apenas na medula e ausentes na periferia fala-se que tem-se leucemia alêucemica.
Patologia
                O hemograma é caracterizado por:
·         Leucocitose: usualmente de aproximadamente 15.000/µl. Sendo que, em 20% dos pacientes os leucometria será>100.000 (leucocitose severa), em 30% será <5.000 (paciente sem leucocitose);
·         Neutropenia (blastos não se diferenciam em neutrófilos);
·         Anemia normocítica e normocrômica (moderada a grave) sem reticulocitose;
·         Plaquetopenia (graus variáveis);
·         95% dos pacientes apresentam meiloblastos circulantes;
A hematoscopia pode conter os seguintes achados:
·         É comum predomínio superior a 70% de blastos sobre os outros leucócitos, porém presença de mais de 5% de blastos no sangue periférico é indicativo de leucemia mieloíde aguda;
·         Presença de grânulos azurofílos citoplasmáticos (define a linhagem granulocítica) e bastonetes de AUER (patognômonico da LMA, são filamentos eosinofílicos);
Anomalias metabólicas secundária ao tunover exagerado das células neoplásicas:
·         Hiperuricemia (aumento da produção de ácido úrico decorrente de hiperproliferação celular), hipercalemia (morte celular gera maior liberação de potássio), hiperfosfatemia, hipercalcemia (blastos produzem peptídeos com ação semelhante ao paratormônio). Esse conjunto de alterações é chamado de síndrome de lise tumoral (temida complicação da quimioterapia).
Diagnóstico: punção aspirativa da medula
O diagnóstico deve ser sempre confirmado pelo mielograma, obtido pelo aspirado da medula óssea, geralmente com punção da crista ilíaca. O aspirado mostrará uma medula óssea hipercelular, devido a substituição das ceululas normais por blastos. Infiltrado de meiloblastos, monoblastos, promonócitos, promielócitos anormais e megacarioblastos.
O diagnostico é firmado pela presença de mais de 20% de blastos na medula, isso porque outros patologias com achados semelhantes cursam com presença de blastos <20%.
                O aspirado ainda permite avaliação citogenética, que é utilizada para tipar e subtipar a leucemia, permitindo inferir o prognóstico e definir o tratamento.
Fatores de riscos em adultos com LMA
Fatores favoráveis
Fatores desfavoráveis
Idade <50 anos
Idade >60 anos
 Fenótipo MDR-1 negativo
Fenótipo MDR-2 positivo
Ausência de desordem hematologia ou quimioterapia ou radioterapia prévias
Presença de desordem hematológica ou tratamento prévio com quimioterapia e/ou radioterapia
Presença de determinadas alterações cariotipas
Presença de determinada alterações cariotipas
 O escore de Karnofsky permite avaliar o grau de capacidade do paciente de realizar suas atividades habituais. Quanto menor o escore mais limitado é o paciente e pior sera seu prognóstico.
Tratamento
                O tratamento é feito geralmente em pacientes <60 anos, pois nesses o tratamento realmente é benéfico. Pacientes com mais 60 anos, apresentam pior prognóstico, características citogenéticas desfavoráveis, elevada resistência á drogas, por isso o tratamento nesses casos é pouco indicado. Usualmente considera-se não só a idade cronológica como também a presença de comorbidades.
                O tratamento se baseia em duas fases:
INDUÇÃO PARA REMISSÃO: tem a função de conseguir remissão completa, tornando as celular leucêmicas indetectáveis. É feito pela quimioterapia (geralmente antraciclinas e citarabina). A remissão completa é atingida em 60-80% dos casos;
TRATAMENTO PÓS-REMISSÃO: tem a função de eliminar todo resíduo da doença com o objetivo de se obter a cura. Antes da instituição dessa etapa a recidiva era de 100%. É feito através de quimioterapia de consolidação e transplante de medula (autógeno ou alogênico) para aqueles pacientes com elevado risco de recidiva.
                A cura ocorre em 30% dos casos. O tratamento ideal para a recidiva é o transplante de medula. A quimioterapia tem alto poder mielotóxico e por isso destrói os clones mieloblásticos.
                 É importante também um tratamento tanto das complicações da doenças como das decorrentes da quimioterapia.

Síndromes mielodisplásicas
                Trata-se de desordens hematológicas adquiridas, caracterizadas pela transformação mutagênica de um clone de um progenitor hematopoiético da medula óssea, que dá origem a células progenitoras anômalas (displásicas), incapazes de seguirem um processo de maturação normal. Essa síndrome se manifesta por pancitopenia em graus variados. Caracteristicamente tem-se a coexistência paradoxal de uma medula normo ou hipercelular, associada á pancitopenia. Essa displasia das células hematopoiéticas pode, mais cedo ou mais tarde, converter-se em uma leucemia aguda (grande potencial para se transformar em LMA).
                 A idade média de acometimento é 65-75 anos, principalmente homens. Alguns doentes relatam história prévia de quimioterapia ou radiação.
Patogenia
                Até o momento não é bem compreendida. Acredita-se que uma única célula progenitora hematopoiética sofra mutações levando a displasia e hematopoiese ineficaz. As células displásicas apresentam capacidade prejudicada de maturação. O setor mais comprometido geralmente é o eritroíde. Por isso, quase sempre o quadro clínico predominante é de uma anemia crônica, refratária ao tratamento medicamentoso.
Suas causas são: genética, pelo uso de quimioterapia(as drogas que mais levam a mielodisplasia são os agentes alquilantes) ou radiação, causas virais, agentes químicos (benzeno) e desconhecida ou idiopática (60-70% dos casos, também chamada de primária, geralmente se apresenta em indivíduos >60 anos e tem curso mais arrastado).
Manifestações clínicas
                Pode ser precedida por uma anemia macrocítica de causa inexplicada (sem evidência de anemia megaloblástica) e discreta trombocitopenia e neutrofilia. Muitos pacientes são assintomáticos e o diagnostico é dado por acaso. Os sinais e sintomas existentes ocorrem devidos ás penias:
·         Anemia: sintoma mais comum, frequentemente desencadeia ICC em cardiopatas. Devido a anemia o paciente apresenta fraqueza, mal estar, adnamia, cansaço;
·         Neutropenia: podendo gerar febre (infecções)e manifestações infecciosas (a chance de infecção é desproporcional ao grau de neutropenia, devido a disfunção dos neutrófilos gerados pelas células displásicas);
·         Trombocitopenias: gerando sangramentos.
A síndrome de Sweet (dermatose neutrofílica aguda) é uma complicação das mielodisplasias, sendo um prenuncia para evolução para LMA. Nessa síndrome, surgem placas eritomatosas no tronco e na face, febre alta e leucocitose neutrofílica.
Exame físico
                Observa-se:
·         Palidez cutâneo-mucosa;
·         Pétequias, equimoses ou sangramentos;
·         Febre (infecção);
·         Hepatomegalia em 30% dos casos e esplenomegalia em 10-20% dos casos (ocorre devido ao segquestro de células por esses órgãos, hematopoiese extramedular ou infiltração);
·         Sinais de IC em cardiopatas;
Avaliação laboratorial
                A anemia é o achado universal, sendo de grau variável. Ela pode ser normo ou macrocítica, com reticulopenia (displasia impede a formação medular de reticulócitos e o corpo entende que dever aumentar a produção de hemácias), RDW aumentado, CHCM normal.
                Leucopenia com neutropenia ocorre em 50% dos casos. Apresenta neutrófilos imaturos (mielocitos ou mieloblastos), porém <20% (diferentemente das leucemia). Monocitose também pode estar presente. Plaquetopenia esta presente em 25% dos casos. Pancitopenia em 50% dos pacientes.
Punção-biopsia de medula óssea
                O diagnóstico deve ser suspeitado em todo paciente idoso que apresente com anemia normocítica ou macrocítica crônica. Nestes pacientes, afastada a existência de anemia megaloblástica, a meielodisplasia passa a ser uma forte possibilidade.
                A confirmação do diagnóstico é feita através da biopsia de medula óssea. Os achados da biopsia são os seguintes: maturação mielóide reduzida; geralmente encontra-se hipercelularidade, com uma ou mais linhas de displasia; em relação a linha eritroíde observa-se sideroblastos em anéis (são eritroblastos que acumulam ferro em suas mitocôndrias, dispostas em volta do núcleo da célula, formando uma espécie de um anel de ferro); fibrose medular; presença de <20% de blastos; presença de anomalias citogenéticas (mutações cromossômicas); ALIP (localização anormal dos precursore mielóides- tomam uma posição central na medula).
                Existe um escore para estratificar o risco do portador de mielodisplasia. Esse escore pontua de 0 a 2, usando 3 variáveis: intensidade de blastos na medula, cariótipo e presença de citopenias.
escore
0
0,5
1,0
1,5
2,0
Percentual de blastos
<5%
5-10%
-
11-20%
21-30%
Cariótipo
bom
Intermediário
pobre
-
-
Penias
0/1
2/3
-
-
-
 Risco segundo o escore: 0- risco baixo; 0,5 a 1,0-intermediário 1; 1,5 á 2,0- intermediário 2.
Tratamento
                Não há tratamento especifico para as síndromes mielodisplásicas. A anemia existente é refratária à medicação. Os pacientes por isso, tendem a receber transfusões de concentrados de hemácias, procurando manter a Hb acima de 7g/dl. O tratamento depende da classificação de risco do escore, dessa forma têm-se:
RISCO BAIXO E INTERMEDIÁRIO: O tratamento será feito utilizando eritropoietina, quelantes de ferro (os pacientes correm o risco de desenvolver deposição de ferro devido as frequentes hemotransfusões) como Deferasirox (Exjade VO) e Mesilato de deferoxamina (Desferal- subcutâneo, IM ou EV), fator estimulador de colônias granulocíticas (G-CSF) e fator estimulador de colônias de granulócitos e monócitos (GM-CSF). Esses últimos aumentam a produção de glóbulos brancos e a logica de se usar esses medicamentos é que nem todas as células estão displásicas, assim pode-se estimular as células normais. São utilizadas em paciente com leucopenia grave e infecções. Outros medicamentos seriam:
·         Azacitidina (Vidaza): produz hipometilação do DNA, reduzindo assim o numero de células displásicas. Injeções subcutâneas;
·         Decitabina (Dacogen): tem ação similar ao Vidaza;
·         Lenalidomida: tem ação imunomoduladora (liga-se as células anormais e as destroem). Não é liberado para uso aqui no Brasil.
RISCO ELEVADO: nesses pacientes deve-se usar quimioterapia (resposta muito ruim a quimioterapia) e transplante de medula (única chance de cura, porém deve ser indicado em pacientes com <50 anos e com boas condições clínicas).
Leucemia mielóide crônica (LMC)
                As leucemias crônicas caracterizam-se pelo acumulo lento e gradativo de clones neoplásicos leucocitários na medula óssea e no sangue. Ao contrário das leucemias agudas, as células que se acumulam estão na fase tardia de maturação (não há bloqueio de maturação).
                A LMC é responsável por 15-20% das leucemias em adultos. A incidência é de 1-2 casos/1000 habitantes/ano. O pico de incidência em adultos é de 50-60 anos, porém existe a forma infantil da doença. Tem leve predomínio no sexo masculino. Seu fator de risco é o contato prévio com radiação ionizante. Casos familiares são esporádicos.
                É uma doença mieloproliferativa com proliferação das células granulocíticas, sem perda de sua capacidade de diferenciação (diferentemente da LMA e síndrome mielodisplásica). No sangue periférico observa-se aumento do numero de granulócitos  e seus precursores imaturos, as vezes com presença de blastos.
                É causado por um tipo especifico de mutação. Mais de 90% dos casos resultam na formação do cromossomo Philadelphia, aberração citogenética, oriunda da translocação recíproca entre o cromossomo 9 e 21, essa fusão forma o gene BCR-ABL1 que sintetiza enzimas que ocasionam a doença (aumentam a divisão celular e bloqueiam a apoptose).
                O clone neoplásico é capaz de se diferenciar em células maduras. Essa diferenciação ocorre preferencialmente na série granulocítica, levando ao acúmulo na medula óssea e no sangue periférico de neutrófilos, bastões, metamielócitos, mielócitos e raramente mieloblastos.
Manifestações clínicas
                É caracterizada por 3 tipos distintos e evolutivos de manifestações:
·         CRÔNICA: presente em 85% dos pacientes no momento do diagnóstico. Maturação de células maduras esta mantida. A apresentação clínica é insidiosa, sendo geralmente assintomática, descoberta de forma acidental. Existe presença de leucocitose. Alguns pacientes apresentam sintomas gerais como: fadiga, mal estar, perda de peso, sudorese excessiva, desconforto abdominal, esplenomegalia, hepatomegalia, sangramentos (disfunção plaquetária), hiperuricemia (aumento do tunover da medula óssea) gerando artrite gotosa e cálculos renais. Essa fase em tratamento progride para a fase acelerada.
·         ACELERADA: a diferenciação de neutrófilos esta reduzida. Há presença de esplenomegalia progressiva, associada a leucocitose progressiva, sem resposta terapêutica.
·         BLÁSTICA: mieloblastos e linfoblastos proliferam de maneira descontrolada (perda total da diferenciação). Clinicamente se apresenta com sangramentos, petéquias, equimoses, febre, dores ósseas (devido a expansão da medula) e rápido aumento do baço. OBS: a LMC é uma das únicas causas de basofilia proeminente e persistente.
Avaliação laboratorial
     FASE CRÔNICA: observa-se leucocitose importante (>20000, as vezes >100.000). aumento de granulócitos maduros e linfócitos normais. Blastos <2%. Leve aumento de eosinófilos e basófilos (mais proeminentes quando inicia a fase blástica). Anemia normocítica e normocrômica. Plaquetas normais ou trombocitose. Quando surgir plaquetopenia deve-se pensar em outro diagnóstico, porque nessa fase há diferenciação normal das células.
FASE ACELERADA: blastos>15%; promielócitos >30%; basófilos >20% e plaquetopenia <100.000 (nessa fase inicia-se a perda da diferenciação).

Diagnóstico
Deve ser suspeitado sempre que houver leucocitose acentuada e mantida em um paciente com esplenomegalia. Nos casos suspeito o mielograma através de biopsia medular deve ser realizado. Nesse observa-se hiperplasia granulocítica com padrão de maturação normal, ilhas eritróides reduzidas em numero e tamanho. Se existir mais que 10-19% de blastos trata-se da fase acelerada, mas se esse valor for >20% trata-se da fase blástica.
A confirmação diagnóstica é feita pela análise citogenética através da pesquisa do cromossomo Philadelphia.
Diferenciação entre LMC e reação leucemóide (gerada por um processo inflamatório)
Assim como a LMC, a reação leucemóide tem presença de leucocitose com desvio a esquerda. Porém nessa, há presença de granulações toxicas nos neutrófilos e uma causa obvia que explique a reação (infecção)
Determinates prognósticos
O prognóstico ira depender do estágio em que a doença se encontra no momento do diagnóstico. Na fase crônica, o prognostico é bom (cerca de 85% dos pacientes são diagnosticados nessa fase). O diagnóstico na fase acelerada ou blástica terá pior prognóstico.
Tratamento
FASE CRÔNICA: quando tratada, apenas 6% dos pacientes evoluíram para as formas graves em 5 anos. São utilizados os inibidores de tirosina-quinase BCR-ALB ( ITK-inibem o gene responsável pela formação do cromossomo Philadelphia): Inatinib (Glivec-VO dose de 400mg/dia), dasatinib (Sprycel) e Nilotinib (Tasigna).
FASE ACELERADA: naqueles pacientes que não estão em uso de ITK, usa-los e em seguida realizar transplante de medula (30-40% de sobrevida em 4 anos). Se o transplante for realizado na fase crônica é sobrevida é de 80%. Por isso, tenta-se regredir a fase acelerada com o uso de ITK antes de realizar o transplante. Se o paciente já esta em uso de ITK, deve-se pesquisar mutação para ITK (paciente pode ser resistente ao ITK). Baseado no resultado do teste utilizar outros ITKs como ponatinib, bosutinib, etc.
FASE BLÁSTICA: geralmente essa fase não responde aos ITK. O tratamanto de escolha então é o transplante de medula. Os resultados são piores do que os obtidos quando realizados na fase crônica ou acelerada. Idealmente deve-se tentar retomar a fase crônica ou acelerada com ITK, geralmente associados a outros quimioterápicos.
Leucemia linfocítica crônica
Trata-se de uma neoplasia hematológica de curso indolente, cujo clone neoplásico é um linfócito B maduro, porém, bloqueado em uma fase de diferenciação, que impede a sua transformação em plasmócito, a célula produtora de anticorpos.
 Consiste de uma doença linfoproliferativa crônica, na qual há acumulo de linfócitos funcionalmente incompetentes. É a forma mais frequente de leucemia. É uma doença de evolução lenta (10-20 anos para se desenvolver) em mais ao menos 30% dos pacientes. Os demais podem apresentar uma fase inicial lenta seguida de uma fase acelerada.
Acomete mais homens, sendo mais frequente em pacientes idosos (70 anos), sendo muito raro em pacientes com 30-40 anos de idade. É mais frequente em brancos. Inexiste fatores de risco ambientais, não estando relacionado á radiação ionizante, benzeno ou agentes alquilantes. Sua etiologia é deconhecida.
Diferente das outras leucemias, ela é uma doença cumulativa, ao invés de proliferativa. Isso porque os linfócitos B neoplásicos são células com tunover lento e meia vida superior aos linfócitos B normais. Dessa forma, com a evolução da doença tem acumulo desse linfócitos na medula óssea, passando em seguida para o sangue periférico, linfonodos, baço e fígado. O paciente vai se tornando debilitado e extremamente propenso a morrer de infecções bacterianas.
Apresentação clínica
                Cerca de 20% dos pacientes são assintomáticos, sendo o diagnóstico descoberto pela presença de linfocitose absoluta (mais de 3.000 linfocitos/mm3) no leucograma. Depois da linfocitose, a linfadenomegalia não dolorosa, geralmente cervical, axilar ou supraclavicular, com crescimento ou redução espontânea, mas que não desaparecem completamente, é o achado mais comum.
E em 10% dos pacientes ocorre uma perda de peso nos últimos meses, com febre inexplicável (>38º C por mais de 2 semanas), sudorese noturna e fadiga fácil. Em 25-50% dos casos há presença de esplenomegalia e em 15-25% dos casos de hepatomegalia.
A pele é o órgão não-linfóide mais frequentemente afetado, principalmente na face pela presença de máculas, pápulas, nódulos ou placas (diagnostico feito por biopsia). Glomerulonefrite membrano-proliferativa pode ocorrer devido a deposição de crioglobulinas no glomérulo.
Exames laboratoriais
                No hemograma observa-se uma linfocitose absoluta >5.000, com presença de citopenias usualmente de leve intensidade, atribuídas á processos auto-imunes. Em 11% dos casos há anemia hemolítica auto-imune (Combs direto positivo) e aumento de reticulócitos. Em 3% dos casos há plaquetopenia auto-imune (púrpura trombocitopênica imune). A presença de anemia e plaquetopenia confere mal prognostico para a doença.
                No esfregaço sanguíneo há presença de células com núcleo bizarro. Outro exame utilizado é a imunofenotipagem, porque apesar dos linfócitos serem macroscopicamente normais, eles são imaturos funcionalmente.
                Podem ser encontrados anormalidades das imunoglobulinas devido ao bloqueio de maturação dos linfócitos B: hipoglobulinemia pode estar presente em 8% dos casos na época do diagnostico e em 2/3 dos pacientes durante a evolução eocasionam risco aumentado de infecção bacteriana. Pode haver aumento de LDH e β2 microglobulina em 60% dos casos, assim como hiperuricemia (isso devido ao tunover aumentado dos linfócitos).
Diagnóstico
                A punção de medula óssea não é essencial para o diagnóstico. Usualmente revela celularidade normal ou aumentada com linfócitos contribuindo com mais de 30% das células nucleadas.
                A biopsia de linfonodo revela apagamento da arquitetura do linfonodo, infiltrado de linfócitos com aparência madura, pequenos, alguns prolifócitos e paraimunoblastos.
Diferença entre LLC e linfoma de pequenas células
                Ambos têm a mesma aparência microscópica no linfonodo (ambos apresentam infiltrado linfocitário). O que os diferencia é que na LLC há linfocitose (>5.000), o que não esta presente no linfoma.
Diagnostico diferencial
                O diagnostico diferencial deve ser feito com situações que podem gerar linfocitose como as infecções viróticas ou não: mononucleose, toxoplasmose. Essas patologias geralmente tem curso clínico diferente e duram poucos dias e semanas, com retorno espontâneo. Outra diferença é que não há alteração da imunofenotipagem dos linfócitos.
Tratamento
                Tem bom prognostico, sendo que nem todos os pacientes requerem tratamento especifico (alguns pacientes terão expectativa de vida normal). Exceto pelo transplante de medula nenhum outro tratamento irá curar a doença.
                 O estadiamento da LLC é fundamental para determinar a história natural da doença, orientando o hematologista quanto a melhor estratégia terapêutica. O mais utilizado é o estadiamento de Rai:

ESTAGIO 0: observação e seguimento clinico, sem tratamento especifico. Deve-se fazer hemograma trimestral. A estabilização durante 1 ano é sinal de doença estável.
ESTAGIO I: radioterapia localizada sem quimioterapia associada.
ESTAGIO III, IV OU EM CASOS DE ANEMIA HEMOLÍTICA, PLAQUETOPENIA E SINTOMAS LIMITANTES: utilização de agentes citotóxicos – análogos da purina (fludarabine, pentostatin); agentes alquilantes (clorambucil, bendamustine); anticorpos monoclonais (rituximab, alemtuzumab) – e medidas utilizadas para prevenir síndrome de lise tumoral como a  hidratação oral e o uso de alopurinol 300mg/dia (acompanhamento com dosagem de acido úrico, potássio e LDH).