As infecções das vias aéreas superiores (IVAS) são
seguramente as causas mais freqüentes de atendimentos pediátricos, tanto em
prontos-socorros como em consultórios. Elas compreendem as rinofaringites, otites,
sinusites e laringites.
São infecções que
apresentam características comuns quanto à etiologia, faixa etária,
sazonalidade e prognóstico. Quanto à etiologia, a grande maioria é provocada
por agentes virais. Acometem principalmente as crianças entre seis meses e
cinco anos de idade, com pico de incidência no outono e inverno e prognóstico
favorável, sem complicações, na imensa maioria dos casos.
As IVAS apresentam,
ainda, em comum alguns fatores predisponentes, como escolaridade precoce,
alergia respiratória e prática de aulas de natação. A escolaridade precoce, a
partir do quinto mês de vida, confina crianças suscetíveis e em fase de
imunidade recebida da mãe em seu mais baixo nível, em ambientes de grande
concentração de agentes virais e bacterianos. A alergia respiratória leva a
inflamação e formação de muco, diminuindo as defesas locais das mucosas das
vias aéreas e favorecendo a colonização das mesmas pelos agentes
infecciosos.
A natação, indicada
indiscriminadamente, sem nenhum tipo de critério, devido ao poder irritante do
cloro sobre a mucosa, pode levar a um agravo da alergia respiratória, com
conseqüente facilitação da instalação do processo infeccioso. Além desse fato,
há ainda que levar em conta o choque térmico a que a criança muitas vezes é
submetida, com conseqüente queda das defesas locais das mucosas e maior risco
de instalação do processo infeccioso.
Rinofaringite
O termo rinofaringite é empregado, principalmente, em substituição a
"resfriado comum". A infecção que afeta a rinofaringe é a mais
freqüente em lactentes e crianças maiores, daí sua importância na prática
pediátrica.
Etiologia
A rinofaringite é entidade infecciosa produzida por vários tipos de vírus entre
os quais podemos citar: influenza, adenovírus, parainfluenza, rinovírus e
outros. A fase purulenta, secundária, é produzida por bactérias invasoras,
sendo as mais freqüentes o pneumococo, os estreptococos hemolíticos, o
Haemophilus influenzae e os estafilococos.
Quadro clínico
O quadro clínico varia do lactente para a criança maior. Nos dois primeiros
anos de vida a febre é sintoma predominante. A coriza está sempre presente,
sendo hialina na fase inicial e podendo transformar-se em purulenta na fase
final. Tosse e mal-estar, com irritabilidade e anorexia, completam o quadro,
que evolui, quando não complicado, para a cura em três a cinco dias. Na criança
maior o quadro é praticamente o mesmo, apenas a febre é que pode estar ausente
ou, então, temos apenas um estado subfebril.
As complicações mais freqüentes são a otite média aguda, as bronquites e
broncopneumonias e as sinusites agudas.
Tratamento
O tratamento é totalmente sintomático, não havendo necessidade de utilização de
antibióticos, a não ser em casos com as complicações acima
citadas. Utiliza-se o ácido acetilsalicílico para a febre, na dosagem de 50 a
70 mg/kg/dia, fracionado em quatro tomadas. Para a coriza se usa solução
fisiológica instilada freqüentemente, duas a três gotas em cada narina, e nos
casos de muita obstrução nasal e que causem muito desconforto à criança se
emprega amoximetazolina 0,025%, no máximo três vezes ao dia.
Faringites agudas
As infecções agudas da faringe não são muito habituais no primeiro ano de vida,
mas ocorrem, a partir daí, com bastante freqüência.
Etiologia
Antigamente se acreditava que todas as infecções da faringe eram provocadas por
bactérias, principalmente o estreptococo hemolítico do grupo b. Atualmente
estudos epidemiológicos e microbiológicos demonstram que agentes virais estão
envolvidos em grande número de faringites, sendo seus principais causadores.
Quadro clínico
A faringoamigdalite bacteriana é quadro agudo, com temperatura elevada (39 a
40oC), sendo que nas primeiras 24 horas praticamente não existem sinais ou
sintomas faríngeos. Ao fim do primeiro dia começam a surgir os sinais de comprometimento
faringoamigdaliano, com ardor e dor à deglutição. O aspecto local varia desde
moderada congestão faringoamigdaliana até aspecto bastante avermelhado, com
edema e lesões exsudativas, tanto da faringe como das amígdalas.
O quadro clínico da faringoamigdalite não bacteriana se apresenta como
sintomatologia mais leve, com ardor e dor faríngea desde o início, bem como a
duração dos sintomas é bem mais curta e quase sempre acompanhada de rinorréia e
afonia. Apesar disso, o diagnóstico diferencial entre um quadro e outro só pode
ser efetuado mediante culturas bacterianas e outras análises que permitam
evidenciar a presença de agente viral.
As complicações mais freqüentes da faringoamigdalite são as linfadenites
cervicais e otites médias; menos freqüentes são os abscessos amigdalianos e as
pneumonias.
Tratamento
O tratamento específico consiste na administração de antibioticoterapia, a
saber:
1. Penicilina benzatina IM, 50.000 U/kg em dose única;
2. Eritromicina 50 mg/kg/dia, via oral em 4 tomadas, por 7 a 10 dias em
pacientes alérgicos à penicilina.
Além disso, usar antitérmico, ácido acetilsalicíclico 50 a 70 mg/kg/dia, em
quatro tomadas.
Otite média aguda
As otites médias agudas são afecções freqüentes nas crianças entre 0 e 4 anos
de idade, havendo depois dessa fase um decréscimo significativo em sua
incidência.
Na grande maioria dos casos são processos infecciosos bacterianos e que surgem
em conseqüência de infecções virais da rinofaringe. Podem ocorrer casos
esporádicos em que o processo viral inicial não está presente, como acontece em
lactentes jovens submetidos a posições errôneas de aleitamento e, menos
freqüentemente, em casos de infecção bacteriana isolada do ouvido médio.
Etiologia
Os agentes infecciosos causadores da otite média aguda na criança são, em ordem
de freqüência, o pneumococo, Haemophilus influenzae (capsulado ou não) e a
Moraxella catharralis.
Quadro clínico
A otite média aguda, como o próprio nome indica, é um quadro agudo de início
abrupto, caracterizado por dor intensa na orelha acometida, sendo de fácil
identificação em crianças que falam e caracterizando-se por choro estridente e
sem acalmia, em lactentes. Na imensa maioria das vezes é doença febril e atinge
a criança durante ou imediatamente após um quadro de infecção viral da
rinofaringe. A dor é provocada pela formação de um verdadeiro abscesso no
ouvido médio, que por vezes rompe a membrana timpânica, drenando através do
conduto auditivo e levando à chamada otite média supurada.
O diagnóstico é suspeitado pela história clínica e confirmado pela otoscopia
que revela hiperemia do conduto auditivo, hiperemia e abaulamento da membrana
timpânica e, nos casos de supuração, mostra saída de pus através do conduto
auditivo.
Tratamento
O tratamento da otite média aguda compreende atender a dor do paciente, que é
intensa, bem como o tratamento etiológico, a fim de resolver o processo. Para
atender à dor usamos analgésicos, como paracetamol ou dipirona, bem como
realizamos compressas quentes secas no ouvido, com resultado bastante
satisfatório. O tratamento etiológico é por nós iniciado com o uso da
amoxicilina, uma vez que o principal agente causal é o pneumococo e, no caso do
hemófilos, a grande maioria é não capsulado e, portanto, com resistência bem
menor aos derivados da ampicilina.
Em casos de otites médias recidivantes ou naquelas cuja resposta terapêutica
não é satisfatória, podendo sugerir a presença da moraxela, usamos a associação
amoxicilina/clavulanato ou amoxicilina/sulbactam ou, então, uma cefalosporina
de segunda geração, como o cefaclor. Gotas otológicas somente são indicadas em
caso de supuração e enquanto esta perdurar. O uso de descongestionantes nasais
sistêmicos, bem como de corticosteróides é extremamente controvertido, embora
seja defendido por alguns otorrinolaringologistas.
Mastoidite
Mastoidite é uma infecção supurativa das células aeradas da mastóide. É
potencialmente uma complicação de todos os casos de otite média, devido à
continuidade da linha mucoperiostal da mastóide com aquela do ouvido médio. A
doença mastoidite pode ser assintomática, com resolução espontânea, chegando
até doença progressiva grave, mesmo com tratamento. Com o advento da
antibioticoterapia no tratamento dos processos infecciosos auditivos, houve uma
diminuição muito grande na freqüência da mastoidite, fato que tornou os
pediatras menos capazes de fazer seu diagnóstico.
Etiologia
Os agentes etiológicos mais freqüentemente envolvidos na mastoidite são, em
primeiro lugar, o Streptococcus pyogenes (estreptococo hemolítico do grupo A);
o S. pneumoniae (pneumococo) é o segundo mais freqüentemente isolado e em
terceiro lugar vem o Staphylococcus aureus. O H. influenzae é muito menos
isolado nos casos de pacientes com mastoidite e otite média do que quando só
existe infecção do ouvido médio.
No caso de mastoidite crônica muda o quadro bacteriológico, sendo, por ordem de
freqüência, mais comumente encontrados o S. aureus e bacilos gram-negativos, em
particular Pseudomonas aeruginosa e, menos freqüentemente, organismos
anaeróbios.
Quadro clínico
O quadro clínico da mastoidite, na grande maioria das vezes, é representado por
uma doença febril aguda, dor de ouvido, na grande maioria dos casos com otite
média aguda. Após dias, às vezes semanas, do início desse quadro surgem na
região retroauricular, descendo até a apófise mastóide, edema, calor e rubor de
extensão variável.
Dentre as complicações mais freqüentes provocadas pela mastoidite, podemos
citar: abscesso subperiostal, paralisia facial, meningite, abscesso cerebral,
empiema subdural, tromboflebite dos seios venosos, osteomielite do temporal e
perda de audição.
Diagnóstico
O diagnóstico da mastoidite é baseado principalmente nos dados clínicos e
auxiliado por radiografia específica. Atualmente, a tomografia computadorizada
tem sido o exame de escolha dos especialistas, visando confirmar o diagnóstico
clínico de mastoidite. A cintilografia com tecnésio não é indicada de rotina,
mas pode ser utilizada em casos de dúvida.
Tratamento
Utilizamos a antibioticoterapia empírica, visando cobrir todos os principais
agentes causadores de mastoidite. Assim sendo, utilizamos uma associação de
oxacilina e ceftriaxone, nas dosagens de 200 mg/kg/dia e 100 mg/kg/dia,
respectivamente. A duração do tratamento nunca é inferior a 14 dias, podendo inclusive
prolongar-se por mais tempo.
A necessidade de drenagem cirúrgica deve sempre ser avaliada conjuntamente com
o especialista.
Nos casos de mastoidite crônica usamos duas associações: clindamicina (50
mgkg/dia) e ceftriaxone, a fim de cobrir, inclusive, a possibilidade de agente
anaeróbio, sendo que nesses casos devemos considerar a eventual substituição do
ceftriaxone pela associação ceftazidime (100 mg/kg/dia) e amicacina (15
mg/kg/dia) em caso de suspeita de Pseudomonas aeruginosa.
Sinusites
As sinusites agudas são patologias infecciosas bacterianas dos seios
paranasais. Elas eram muito pouco diagnosticadas há 10 ou 15 anos, sendo
naquela época até questionada sua existência. Dessa época para cá com o avanço
dos meios diagnósticos, seu diagnóstico passou a ser feito com mais freqüência
e hoje o que se vê é que a sinusite é superdiagnosticada em Prontos-Socorros de
Pediatria, seguramente muitas vezes erroneamente e com prejuízo para o
paciente. Como veremos, a sinusopatia pressupõe, primeiro, seios aerados para
ocorrer e, em segundo lugar, apresentar clínica e não deve basear-se
exclusivamente em um achado radiológico.
Desenvolvimento dos seios paranasais
Os seios etmoidais se localizam em ambos os lados da linha média do osso
etmóide, que se apresenta limitado lateralmente pela órbita, fato esse que
permite a extensão da etmoidite até a região periorbitária. Eles apresentam
aeração parcial já ao nascimento.
Os seios maxilares ao nascimento estão pouco aerados, apresentando uma aeração
mais diferenciada a partir do segundo semestre de vida e vão completando-se a
partir do quarto ano de vida.
O seio frontal está presente ao nascimento, mas não se acha aerado, fato esse
que só ocorrerá a partir do oitavo ano de vida.
Os seios esfenoidais apresentam desenvolvimento lento e, por serem isolados,
ficam preservados de infecções freqüentes. Sua aeração só se inicia em torno do
terceiro ou quarto ano de idade.
Patogênese
Acredita-se que a obstrução dos óstios de drenagem seja a primeira manifestação
a ocorrer nas sinusites. Por isso, na maioria das vezes, a rinite ou resfriado
comum precedem, invariavelmente, a instalação de uma sinusite.
Etiologia
A etiologia das sinusites é semelhante à das otites, sendo representado pelo
pneumococo, Haemophilus influenzae (capsulado ou não), Moraxella catarrhalis,
Streptococcus pyogenes, e muito raramente anaeróbios.
Nos quadros de sinusite que se cronificam a ordem de freqüência se modifica,
passando a etiologia a ser representada por Streptococcus alfa-hemolitico,
Stafilococcus aureus, Moraxella catarrhalis e, por último, pneumococo e
Haemophilus influenzae.
Quadro clínico
O quadro clínico das sinusites é definido pela sua patogenia, obstrução de vias
de drenagem e formação de secreção mucopurulenta que passa a ser eliminada. Por
isso, na grande maioria dos casos, temos tosse produtiva, principalmente
noturna, impedindo a criança de dormir e secreção mucopurulenta nasal
constante, principalmente pela manhã. A febre nem sempre está presente e,
portanto, sinusite não é diagnóstico diferencial de febre de algumas horas e
sem achados clínicos. Em lactentes com etmoidite poderemos ter o edema
periorbitário, devido à contigüidade com a órbita como único sinal da doença. A
célebre cefaléia só ocorre após os oito anos, pois é só nessa época que o seio
frontal se pneumatiza e podemos ter sua infecção.
Assim, vemos que sinusite tem clínica, tem epidemiologia e tem sinais clínicos,
não sendo diagnosticada com base exclusivamente em febre ou em um achado
radiológico que poderá apenas significar uma infecção pregressa, já curada, mas
ainda sem a restituição total da aeração do seio em questão.
As complicações mais freqüentes e graves das sinusites são as celulites
periorbitárias pós-septais e a propagação intracraniana da infecção, podendo
ocorrer meningite, empiema subdural, abscessos parenquimatosos e a mais temida,
trombose do seio cavernoso.
Diagnóstico
A suspeita clínica deve ser confirmada através do RX, realizado por técnico
experiente; caso contrário teremos muita margem de erro, dado que existem
posições específicas para se visualizarem os seios da face. Deve-se, também,
levar em conta a época de pneumatização dos seios, para não incorrer em erros.
A tomografia é o método de escolha para confirmar o diagnóstico de sinusite,
mas, dado seu alto custo, só deverá ser realizado em casos de muita dúvida.
Tratamento
O tratamento da sinusite aguda é feito com antibioticoterapia, semelhante à
usada na otite média, uma vez que os agentes são praticamente os mesmos. O que
muda e é importante é a duração do mesmo, que não deve ser inferior a 15 dias.
Muitos dos insucessos no tratamento das sinusites ocorrem por serem curtos,
levando às vezes à cronificação do processo. Nos casos crônicos, a duração da
terapêutica se estende por três a quatro semanas e, nos casos em que haja
suspeita de anaeróbio, deve-se associar a clindamicina.
A exemplo do que ocorre na otite média aguda, o tratamento com
descongestionantes (tópicos ou sistêmicos), bem como o uso de corticóide, é
controverso.
Laringites
As infecções agudas da laringe têm importância pela freqüência com que acometem
as crianças, principalmente os lactentes, e pelo risco potencial de levar a
insuficiência respiratória obstrutiva aguda, com risco de vida.
Laringite estridulosa
A laringite estridulosa acomete preferencialmente crianças de um a cinco anos
de idade. Geralmente é precedida por um resfriado comum, mas na verdade sua
etiologia é desconhecida, admitindo-se principalmente o comprometimento
alérgico, pessoal ou de familiares. Ela é sazonal e ocorre com freqüência nos
meses de inverno, principalmente em noites com queda brusca de temperatura e
quetenham sido precedidos por um dia mais quente.
O quadro é agudo e se instala em criança previamente hígida e que acorda no
meio da noite com estridor, cornagem, dificuldade respiratória e tosse rouca,
envoluindo afebril. Após algumas horas o processo regride e a criança se
encontra novamente bem.
A conduta nesses casos, embora controversa na literatura, que acredita na
remissão espontânea, é o uso de vapor quente e corticoterapia, tentando evitar
o edema de glote e a necessidade de intubação e/ou traqueostomia. Raramente há
necessidade de recorrer ao uso de adrenalina, por via inalatória ou subcutânea.
A doença evolui em surtos, recidivando a cada ano por uma a três vezes, até
que, por volta de cinco anos de idade, o processo desaparece definitivamente.
Laringite viral
A laringite viral é a forma mais comum de acometimento da laringe em crianças e
se inicia, geralmente, por um quadro respiratório mais alto que depois acomete
a laringe e também a traquéia. É a causa mais comum de obstrução respiratória
alta na infância, sendo que em torno de 5% a 10% dos casos necessitam de
hospitalização e desse número de 1% a 2% necessitam de intubação.
Etiologia
Os agentes mais comuns são os vírus parainfluenza tipo I e II e,
ocasionalmente, os vírus influenza A e B e o vírus sincicial respiratório.
Quadro clínico
O quadro se inicia como um resfriado comum, com tosse seca, febre e rinorréia
hialina; com a evolução surge a tosse rouca, pelo edema inflamatório das cordas
vocais. Surgem o estridor, a cornagem e obstrução alta, que será tanto mais
grave quanto menor for a idade da criança, dado o menor calibre da laringe.
Tratamento
Apesar da eterna controvérsia, a partir da década de 80 a literatura mostra o
benefício para o paciente na utilização da terapia com corticóide por via
sistêmica, tanto dexametasona quanto prednisolona, sendo que o emprego precoce
dessas drogas reduz o número de pacientes que necessitam de UTI e ventilação
assistida.
Epiglotite aguda
É um processo infeccioso da epiglote e dos tecidos vizinhos, de instalação
abrupta e rapidamente progressiva, constituindo-se em emergência médica, pelo
risco de obstrução respiratória, que pode levar à morte.
Acomete crianças de dois a cinco anos de idade, com pico em torno de 3,5 anos.
O agente etiológico é o Haemophilus influenzae capsulado do tipo b, sendo uma
doença que se instala através de bacteremia.
O quadro clínico é febril, agudo, não há pródromos de infecção de rinofaringe,
ocorrendo rapidamente dor à deglutição, estridor, cornagem e letargia, o que dá
à doença o motivo para ser chamada "falso crupe". Por vezes, na fase
inicial, ao examinarmos o "cavum" podemos ver a epiglote edemaciada,
com coloração vermelho intenso e brilhante.
Quando a criança nos chega em fase mais avançada ela se acha irritada, com a
boca aberta, sialorréia intensa e a expressão ansiosa, com o pescoço estendido
e a cabeça inclinada para frente. Deve-se colher hemocultura, que apresenta em
torno de 50% a 80% de sensibilidade, para confirmar o diagnóstico.
Tratamento
É consenso que na suspeita de epiglotite deve proceder-se a intubação a fim de
preservar a via respiratória e a vida do paciente. A seguir se inicia a
antibioticoterapia, hoje instituindo-se o ceftriaxone, que é uma cefalosporina
de terceira geração, uma vez que não há descrição na literatura de Haemophilus
influenzae tipo b resistente a ela.
Com o tratamento, geralmente o paciente é extubado em 48 a 72 horas e recebe a
antibioticoterapia por sete a dez dias, com recuperação total.
domingo, 1 de junho de 2014
Leucemias e linfomas
Classificação do
leucócitos
Os
leucócitos são divididos em granulócitos (neutrófilos, eosinófilos e basófilos)
e agranulócitos (linfócitos e monócitos). O seu número varia com a
idade, sexo e condições fisiológicas. No adulto normal é de 6000 a 10000/µl. Têm
como função geral a defesa humoral e tecidular e podem migrar através da parede
dos capilares. Todos os leucócitos exibem movimentos ameboides, que lhes
permitem migrar para dentro e para fora (diapedese) do sistema circulatório e
pelos tecidos.
Os neutrófilos possuem núcleo trilobular e tem
a função de fagocitose. Os eosinófilos possuem núcleo bilobular, são também
células fagocitárias que atuam em processos alérgicos e parasitoses
intestinais. Os basófilos são células com grânulos mais grosseiros que liberam
histamina e heparina. Os linfócitos são células mononucleadas com núcleo grande
dividida em : linfócito T citotóxico, linfócitos T auxiliares, linfócitos T
supressores e linfócitos B. Os monócitos são células com núcleo em forma de rim
que se convertem nos tecidos em macrófagos, células fagocitárias.
Granulopoiese
Consiste no
desenvolvimento dos leucócitos dentro da medula óssea. Da mesma forma que os
eritrócitos a medida que essas células de diferenciam elas reduzem seu
diâmetro.
Segmentados
Linfopoiese
É
caracterizada por apenas dois estágios precursores: linfoblasto, pro-linfócito
e linfócito maduro. A principal característica da linfopoiese é uma diminuição
progressiva do tamanho da célula.
Trombopoiese
As plaquetas
derivam na unidade formadora de megacariócitos e a sua formação inclui a
seguinte sequência: megacarioblasto, pró-megacariócito, megacariócito e
plaquetas.
Leucemia mielóide aguda (LMA)
É
a leucemia mais comum, afetando uma faixa etária bastante ampla. É uma doença
maligna, caracterizada pela rápida proliferação de blastos, acumulando-se na
medula óssea e impedindo a produção normal de outras células sanguíneas.
Embora
rara (1,2% de óbitos por doenças hematológicas nos EUA), é o principal tipo de
leucemia aguda afetando adultos (80% dos casos) e raramente ocorre em crianças.
Tem ligeira preferência pelo sexo masculino.
Mecanismos envolvidos na etiologia
Sabe-se que na
maioria das neoplasias há expressão de um ou mais oncogêneses (porções do DNA
responsáveis pelo bloqueio da apoptose). Normalmente esses oncogêneses estão
localizados em regiões inativas dos cromossomos. Contudo mutações podem ativar
esses genes e suprimir anti-oncogêneses. As alterações cromossomais mais
importantes na LMA são as translocações e inversões.
Os
mecanismos envolvidos são os seguintes: ativação de gens anormais por
translocação de cromossomos ou outras anormalidades genéticas. A maior parte
dos pacientes não tem fator de risco identificável. Os fatores congênitos que
podem contribuir para o aparecimento da doença são: Síndrome de Down,
neutropenia congênita, anemia de Falconi (patologia autossômica recessiva associada a instabilidade cromossômica,
caracterizada por heterogeneidade fenotípica, que inclui falência medular,
múltiplas malformações congênitas, predisposição para o desenvolvimento de
leucemia mielóide aguda (LMA) e hipersensibilidade celular a agentes formadores
de ligações cruzadas de ADN), neurofibromatoses.
A presença de doenças hematológicas
prévias como síndrome mielodisplasica (mais frequente em idosos), anemia
aplástica, policitemia vera, hemoglobinúria paroxística noturna, predispõe
também ao surgimento dessa patologia. Fatores ambientais como exposição a
radiação ionizante, tabagismo, benzeno e outros solventes e quimioterapia
prévia. Porém, na maioria das vezes não existe um fator identificado.
Fisiopatologia
Os miloblastos tem a função de formarem os glóbulos brancos. Um
mieloblasto normal induz a maturação dos leucócitos. Na LMA um único
mieloblasto anormal mantém os demais leucócitos em seu estado imaturo,
impedindo a maturação celular. Associado a isto estão às mutações que impedem o
controle da proliferação celular. Ocorre também um impedimento da apoptose,
produzindo o acumulo dessas células na medula (acumulo de blastos). A
proliferação excessiva dessa resulta em redução da produção de eritrócitos,
leucócitos normais e plaquetas, pela falta de espaço medular. As consequências
disso são anemias pela eritropenia, sangramentos devido à plaquetopenia e risco
aumentado de infecções devido as lecocitoses a custa de blastos (apesar do
aumento de meiloblastos estes são imaturos e não conseguem promover a proteção
ao organismo).
Apresentação clínica
A
tríade sintomática da leucemia aguda é: astenia (fraqueza), hemorragia e febre
(todos sintomas relativos a insuficiência hematopoiética medular). São sintomas
também encontrados na anemia aplástica e, por isso essa deve ser considerada
como diagnóstico diferencial. Além dessa tríade encontra-se: palidez (devido a
anemia), sangramento gengival, metrorragia, hematomas ou outros sangramentos
(devido a plaquetopenia, as vezes a diátese hemorrágica é desproporcional ao
grau de plaquetopenia, devido a disfunção plaquetária). Infecções (devido a não
diferenciação dos blastos), dores ósseas (expansão da medula óssea pelo
processo leucêmico). Em caso de febre deve-se sempre pensar em infecção ou em
neoplasia. Se os neutrófilos <1000 indica uma neutropenia grave e nesse caso
deve-se usar ATB de amplo espectro. Hepatoesplenomegalia ou adenomegalias são
raros.
Quando
a leucometria alcança valores muito elevados, acarretando hiperleucocitose pode
ocorrer aumento da viscosidade sanguínea e os leucócitos podem aderir ao
endotélio das veias pulmonares e de outros órgãos, gerando sintomas
neurológicos (cefaleia, borramento visual, parestesias, torpor, coma, crise
convulsiva), pulmonares e genito-urinários. Esta é chamada de crise leucostase.
OBS: quando os blastos estão presentes apenas na medula e ausentes na periferia
fala-se que tem-se leucemia alêucemica.
Patologia
O hemograma é caracterizado por:
·
Leucocitose:
usualmente de aproximadamente 15.000/µl. Sendo que, em 20% dos pacientes os
leucometria será>100.000 (leucocitose severa), em 30% será <5.000
(paciente sem leucocitose);
·
Neutropenia
(blastos não se diferenciam em neutrófilos);
·
Anemia
normocítica e normocrômica (moderada a grave) sem reticulocitose;
·
Plaquetopenia
(graus variáveis);
·
95%
dos pacientes apresentam meiloblastos circulantes;
A hematoscopia pode conter os
seguintes achados:
·
É
comum predomínio superior a 70% de blastos sobre os outros leucócitos, porém
presença de mais de 5% de blastos no sangue periférico é indicativo de leucemia
mieloíde aguda;
·
Presença
de grânulos azurofílos citoplasmáticos (define a linhagem granulocítica) e
bastonetes de AUER (patognômonico da LMA, são filamentos eosinofílicos);
Anomalias metabólicas secundária ao tunover exagerado das
células neoplásicas:
·
Hiperuricemia
(aumento da produção de ácido úrico decorrente de hiperproliferação celular),
hipercalemia (morte celular gera maior liberação de potássio), hiperfosfatemia,
hipercalcemia (blastos produzem peptídeos com ação semelhante ao paratormônio).
Esse conjunto de alterações é chamado de síndrome de lise tumoral (temida
complicação da quimioterapia).
Diagnóstico: punção
aspirativa da medula
O diagnóstico deve ser sempre
confirmado pelo mielograma, obtido pelo aspirado da medula óssea, geralmente
com punção da crista ilíaca. O aspirado mostrará uma medula óssea hipercelular,
devido a substituição das ceululas normais por blastos. Infiltrado de
meiloblastos, monoblastos, promonócitos, promielócitos anormais e
megacarioblastos.
O diagnostico é firmado pela presença
de mais de 20% de blastos na medula, isso porque outros patologias com achados
semelhantes cursam com presença de blastos <20%.
O
aspirado ainda permite avaliação citogenética, que é utilizada para tipar e
subtipar a leucemia, permitindo inferir o prognóstico e definir o tratamento.
Fatores de riscos em adultos com LMA
Fatores
favoráveis
|
Fatores
desfavoráveis
|
Idade
<50 anos
|
Idade
>60 anos
|
Fenótipo MDR-1 negativo
|
Fenótipo
MDR-2 positivo
|
Ausência
de desordem hematologia ou quimioterapia ou radioterapia prévias
|
Presença
de desordem hematológica ou tratamento prévio com quimioterapia e/ou
radioterapia
|
Presença
de determinadas alterações cariotipas
|
Presença
de determinada alterações cariotipas
|
O escore de Karnofsky permite avaliar o grau de capacidade
do paciente de realizar suas atividades habituais. Quanto menor o escore mais
limitado é o paciente e pior sera seu prognóstico.
Tratamento
O
tratamento é feito geralmente em pacientes <60 anos, pois nesses o
tratamento realmente é benéfico. Pacientes com mais 60 anos, apresentam pior
prognóstico, características citogenéticas desfavoráveis, elevada resistência á
drogas, por isso o tratamento nesses casos é pouco indicado. Usualmente considera-se
não só a idade cronológica como também a presença de comorbidades.
O
tratamento se baseia em duas fases:
INDUÇÃO PARA REMISSÃO: tem a função de conseguir remissão
completa, tornando as celular leucêmicas indetectáveis. É feito pela
quimioterapia (geralmente antraciclinas e citarabina). A remissão completa é
atingida em 60-80% dos casos;
TRATAMENTO PÓS-REMISSÃO: tem a função de eliminar todo
resíduo da doença com o objetivo de se obter a cura. Antes da instituição dessa
etapa a recidiva era de 100%. É feito através de quimioterapia de consolidação
e transplante de medula (autógeno ou alogênico) para aqueles pacientes com
elevado risco de recidiva.
A
cura ocorre em 30% dos casos. O tratamento ideal para a recidiva é o
transplante de medula. A quimioterapia tem alto poder mielotóxico e por isso
destrói os clones mieloblásticos.
É importante também um tratamento tanto das
complicações da doenças como das decorrentes da quimioterapia.
Síndromes mielodisplásicas
Trata-se
de desordens hematológicas adquiridas, caracterizadas pela transformação
mutagênica de um clone de um progenitor hematopoiético da medula óssea, que dá
origem a células progenitoras anômalas (displásicas), incapazes de seguirem um processo
de maturação normal. Essa síndrome se manifesta por pancitopenia em graus
variados. Caracteristicamente tem-se a coexistência paradoxal de uma medula
normo ou hipercelular, associada á pancitopenia. Essa displasia das células
hematopoiéticas pode, mais cedo ou mais tarde, converter-se em uma leucemia
aguda (grande potencial para se transformar em LMA).
A idade média de acometimento é 65-75 anos,
principalmente homens. Alguns doentes relatam história prévia de quimioterapia
ou radiação.
Patogenia
Até
o momento não é bem compreendida. Acredita-se que uma única célula progenitora
hematopoiética sofra mutações levando a displasia e hematopoiese ineficaz. As
células displásicas apresentam capacidade prejudicada de maturação. O setor
mais comprometido geralmente é o eritroíde. Por isso, quase sempre o quadro
clínico predominante é de uma anemia crônica, refratária ao tratamento
medicamentoso.
Suas causas são: genética, pelo uso de
quimioterapia(as drogas que mais levam a mielodisplasia são os agentes alquilantes)
ou radiação, causas virais, agentes químicos (benzeno) e desconhecida ou
idiopática (60-70% dos casos, também chamada de primária, geralmente se
apresenta em indivíduos >60 anos e tem curso mais arrastado).
Manifestações clínicas
Pode
ser precedida por uma anemia macrocítica de causa inexplicada (sem evidência de
anemia megaloblástica) e discreta trombocitopenia e neutrofilia. Muitos
pacientes são assintomáticos e o diagnostico é dado por acaso. Os sinais e
sintomas existentes ocorrem devidos ás penias:
·
Anemia:
sintoma mais comum, frequentemente desencadeia ICC em cardiopatas. Devido a
anemia o paciente apresenta fraqueza, mal estar, adnamia, cansaço;
·
Neutropenia:
podendo gerar febre (infecções)e manifestações infecciosas (a chance de
infecção é desproporcional ao grau de neutropenia, devido a disfunção dos
neutrófilos gerados pelas células displásicas);
·
Trombocitopenias:
gerando sangramentos.
A síndrome de Sweet (dermatose
neutrofílica aguda) é uma complicação das mielodisplasias, sendo um prenuncia
para evolução para LMA. Nessa síndrome, surgem placas eritomatosas no tronco e
na face, febre alta e leucocitose neutrofílica.
Exame físico
Observa-se:
·
Palidez
cutâneo-mucosa;
·
Pétequias,
equimoses ou sangramentos;
·
Febre
(infecção);
·
Hepatomegalia
em 30% dos casos e esplenomegalia em 10-20% dos casos (ocorre devido ao
segquestro de células por esses órgãos, hematopoiese extramedular ou
infiltração);
·
Sinais
de IC em cardiopatas;
Avaliação laboratorial
A
anemia é o achado universal, sendo de grau variável. Ela pode ser normo ou
macrocítica, com reticulopenia (displasia impede a formação medular de
reticulócitos e o corpo entende que dever aumentar a produção de hemácias), RDW
aumentado, CHCM normal.
Leucopenia
com neutropenia ocorre em 50% dos casos. Apresenta neutrófilos imaturos
(mielocitos ou mieloblastos), porém <20% (diferentemente das leucemia).
Monocitose também pode estar presente. Plaquetopenia esta presente em 25% dos
casos. Pancitopenia em 50% dos pacientes.
Punção-biopsia de medula
óssea
O diagnóstico deve ser suspeitado em todo paciente idoso que apresente
com anemia normocítica ou macrocítica crônica. Nestes pacientes, afastada a
existência de anemia megaloblástica, a meielodisplasia passa a ser uma forte
possibilidade.
A
confirmação do diagnóstico é feita através da biopsia de medula óssea. Os
achados da biopsia são os seguintes: maturação mielóide reduzida; geralmente
encontra-se hipercelularidade, com uma ou mais linhas de displasia; em relação
a linha eritroíde observa-se sideroblastos em anéis (são eritroblastos que
acumulam ferro em suas mitocôndrias, dispostas em volta do núcleo da célula,
formando uma espécie de um anel de ferro); fibrose medular; presença de <20%
de blastos; presença de anomalias citogenéticas (mutações cromossômicas); ALIP
(localização anormal dos precursore mielóides- tomam uma posição central na
medula).
Existe
um escore para estratificar o risco do portador de mielodisplasia. Esse escore
pontua de 0 a 2, usando 3 variáveis: intensidade de blastos na medula, cariótipo
e presença de citopenias.
escore
|
0
|
0,5
|
1,0
|
1,5
|
2,0
|
Percentual
de blastos
|
<5%
|
5-10%
|
-
|
11-20%
|
21-30%
|
Cariótipo
|
bom
|
Intermediário
|
pobre
|
-
|
-
|
Penias
|
0/1
|
2/3
|
-
|
-
|
-
|
Risco segundo o
escore: 0- risco baixo; 0,5 a 1,0-intermediário 1; 1,5 á 2,0- intermediário 2.
Tratamento
Não há tratamento especifico para as síndromes mielodisplásicas. A
anemia existente é refratária à medicação. Os pacientes por isso, tendem a
receber transfusões de concentrados de hemácias, procurando manter a Hb acima
de 7g/dl. O tratamento depende da classificação de risco do escore, dessa forma
têm-se:
RISCO BAIXO E INTERMEDIÁRIO: O tratamento será feito
utilizando eritropoietina, quelantes de ferro (os pacientes correm o risco de
desenvolver deposição de ferro devido as frequentes hemotransfusões) como
Deferasirox (Exjade VO) e Mesilato de deferoxamina (Desferal- subcutâneo, IM ou
EV), fator estimulador de colônias granulocíticas (G-CSF) e fator estimulador
de colônias de granulócitos e monócitos (GM-CSF). Esses últimos aumentam a
produção de glóbulos brancos e a logica de se usar esses medicamentos é que nem
todas as células estão displásicas, assim pode-se estimular as células normais.
São utilizadas em paciente com leucopenia grave e infecções. Outros
medicamentos seriam:
·
Azacitidina
(Vidaza): produz hipometilação do DNA, reduzindo assim o numero de células
displásicas. Injeções subcutâneas;
·
Decitabina
(Dacogen): tem ação similar ao Vidaza;
·
Lenalidomida:
tem ação imunomoduladora (liga-se as células anormais e as destroem). Não é
liberado para uso aqui no Brasil.
RISCO ELEVADO: nesses pacientes deve-se usar
quimioterapia (resposta muito ruim a quimioterapia) e transplante de medula
(única chance de cura, porém deve ser indicado em pacientes com <50 anos e
com boas condições clínicas).
Leucemia mielóide crônica (LMC)
As
leucemias crônicas caracterizam-se pelo acumulo lento e gradativo de clones
neoplásicos leucocitários na medula óssea e no sangue. Ao contrário das
leucemias agudas, as células que se acumulam estão na fase tardia de maturação
(não há bloqueio de maturação).
A
LMC é responsável por 15-20% das leucemias em adultos. A incidência é de 1-2
casos/1000 habitantes/ano. O pico de incidência em adultos é de 50-60 anos,
porém existe a forma infantil da doença. Tem leve predomínio no sexo masculino.
Seu fator de risco é o contato prévio com radiação ionizante. Casos familiares
são esporádicos.
É
uma doença mieloproliferativa com proliferação das células granulocíticas, sem
perda de sua capacidade de diferenciação (diferentemente da LMA e síndrome
mielodisplásica). No sangue periférico observa-se aumento do numero de
granulócitos e seus precursores
imaturos, as vezes com presença de blastos.
É
causado por um tipo especifico de mutação. Mais de 90% dos casos resultam na
formação do cromossomo Philadelphia, aberração citogenética, oriunda da
translocação recíproca entre o cromossomo 9 e 21, essa fusão forma o gene
BCR-ABL1 que sintetiza enzimas que ocasionam a doença (aumentam a divisão
celular e bloqueiam a apoptose).
O
clone neoplásico é capaz de se diferenciar em células maduras. Essa
diferenciação ocorre preferencialmente na série granulocítica, levando ao
acúmulo na medula óssea e no sangue periférico de neutrófilos, bastões,
metamielócitos, mielócitos e raramente mieloblastos.
Manifestações clínicas
É caracterizada por 3 tipos distintos e evolutivos de manifestações:
·
CRÔNICA:
presente em 85% dos pacientes no momento do diagnóstico. Maturação de células
maduras esta mantida. A apresentação clínica é insidiosa, sendo geralmente
assintomática, descoberta de forma acidental. Existe presença de leucocitose.
Alguns pacientes apresentam sintomas gerais como: fadiga, mal estar, perda de
peso, sudorese excessiva, desconforto abdominal, esplenomegalia, hepatomegalia,
sangramentos (disfunção plaquetária), hiperuricemia (aumento do tunover da
medula óssea) gerando artrite gotosa e cálculos renais. Essa fase em tratamento
progride para a fase acelerada.
·
ACELERADA:
a diferenciação de neutrófilos esta reduzida. Há presença de esplenomegalia
progressiva, associada a leucocitose progressiva, sem resposta terapêutica.
·
BLÁSTICA:
mieloblastos e linfoblastos proliferam de maneira descontrolada (perda total da
diferenciação). Clinicamente se apresenta com sangramentos, petéquias,
equimoses, febre, dores ósseas (devido a expansão da medula) e rápido aumento
do baço. OBS: a LMC é uma das únicas causas de basofilia proeminente e
persistente.
Avaliação laboratorial
FASE CRÔNICA: observa-se leucocitose
importante (>20000, as vezes >100.000). aumento de granulócitos maduros e
linfócitos normais. Blastos <2%. Leve aumento de eosinófilos e basófilos
(mais proeminentes quando inicia a fase blástica). Anemia normocítica e normocrômica.
Plaquetas normais ou trombocitose. Quando surgir plaquetopenia deve-se pensar
em outro diagnóstico, porque nessa fase há diferenciação normal das células.
FASE ACELERADA: blastos>15%;
promielócitos >30%; basófilos >20% e plaquetopenia <100.000 (nessa
fase inicia-se a perda da diferenciação).
Diagnóstico
Deve ser suspeitado sempre que houver
leucocitose acentuada e mantida em um paciente com esplenomegalia. Nos casos
suspeito o mielograma através de biopsia medular deve ser realizado. Nesse observa-se
hiperplasia granulocítica com padrão de maturação normal, ilhas eritróides
reduzidas em numero e tamanho. Se existir mais que 10-19% de blastos trata-se
da fase acelerada, mas se esse valor for >20% trata-se da fase blástica.
A confirmação diagnóstica é feita pela
análise citogenética através da pesquisa do cromossomo Philadelphia.
Diferenciação entre LMC
e reação leucemóide (gerada por um processo inflamatório)
Assim como a LMC, a reação leucemóide
tem presença de leucocitose com desvio a esquerda. Porém nessa, há presença de
granulações toxicas nos neutrófilos e uma causa obvia que explique a reação
(infecção)
Determinates
prognósticos
O prognóstico ira depender do estágio
em que a doença se encontra no momento do diagnóstico. Na fase crônica, o prognostico
é bom (cerca de 85% dos pacientes são diagnosticados nessa fase). O diagnóstico
na fase acelerada ou blástica terá pior prognóstico.
Tratamento
FASE CRÔNICA: quando tratada, apenas
6% dos pacientes evoluíram para as formas graves em 5 anos. São utilizados os
inibidores de tirosina-quinase BCR-ALB ( ITK-inibem o gene responsável pela
formação do cromossomo Philadelphia): Inatinib (Glivec-VO dose de 400mg/dia),
dasatinib (Sprycel) e Nilotinib (Tasigna).
FASE ACELERADA: naqueles pacientes que
não estão em uso de ITK, usa-los e em seguida realizar transplante de medula
(30-40% de sobrevida em 4 anos). Se o transplante for realizado na fase crônica
é sobrevida é de 80%. Por isso, tenta-se regredir a fase acelerada com o uso de
ITK antes de realizar o transplante. Se o paciente já esta em uso de ITK,
deve-se pesquisar mutação para ITK (paciente pode ser resistente ao ITK).
Baseado no resultado do teste utilizar outros ITKs como ponatinib, bosutinib,
etc.
FASE BLÁSTICA: geralmente essa fase não
responde aos ITK. O tratamanto de escolha então é o transplante de medula. Os
resultados são piores do que os obtidos quando realizados na fase crônica ou
acelerada. Idealmente deve-se tentar retomar a fase crônica ou acelerada com
ITK, geralmente associados a outros quimioterápicos.
Leucemia linfocítica crônica
Trata-se de uma neoplasia hematológica
de curso indolente, cujo clone neoplásico é um linfócito B maduro, porém,
bloqueado em uma fase de diferenciação, que impede a sua transformação em plasmócito,
a célula produtora de anticorpos.
Consiste de uma doença linfoproliferativa
crônica, na qual há acumulo de linfócitos funcionalmente incompetentes. É a
forma mais frequente de leucemia. É uma doença de evolução lenta (10-20 anos
para se desenvolver) em mais ao menos 30% dos pacientes. Os demais podem
apresentar uma fase inicial lenta seguida de uma fase acelerada.
Acomete mais homens, sendo mais
frequente em pacientes idosos (70 anos), sendo muito raro em pacientes com
30-40 anos de idade. É mais frequente em brancos. Inexiste fatores de risco
ambientais, não estando relacionado á radiação ionizante, benzeno ou agentes
alquilantes. Sua etiologia é deconhecida.
Diferente das outras leucemias, ela é
uma doença cumulativa, ao invés de proliferativa. Isso porque os linfócitos B
neoplásicos são células com tunover lento e meia vida superior aos linfócitos B
normais. Dessa forma, com a evolução da doença tem acumulo desse linfócitos na
medula óssea, passando em seguida para o sangue periférico, linfonodos, baço e
fígado. O paciente vai se tornando debilitado e extremamente propenso a morrer
de infecções bacterianas.
Apresentação clínica
Cerca de 20% dos pacientes são assintomáticos, sendo o diagnóstico
descoberto pela presença de linfocitose absoluta (mais de 3.000 linfocitos/mm3)
no leucograma. Depois da linfocitose, a linfadenomegalia não dolorosa,
geralmente cervical, axilar ou supraclavicular, com crescimento ou redução
espontânea, mas que não desaparecem completamente, é o achado mais comum.
E em 10% dos pacientes ocorre uma
perda de peso nos últimos meses, com febre inexplicável (>38º C por mais de
2 semanas), sudorese noturna e fadiga fácil. Em 25-50% dos casos há presença de
esplenomegalia e em 15-25% dos casos de hepatomegalia.
A pele é o órgão não-linfóide mais
frequentemente afetado, principalmente na face pela presença de máculas,
pápulas, nódulos ou placas (diagnostico feito por biopsia). Glomerulonefrite
membrano-proliferativa pode ocorrer devido a deposição de crioglobulinas no
glomérulo.
Exames laboratoriais
No
hemograma observa-se uma linfocitose absoluta >5.000, com presença de
citopenias usualmente de leve intensidade, atribuídas á processos auto-imunes.
Em 11% dos casos há anemia hemolítica auto-imune (Combs direto positivo) e
aumento de reticulócitos. Em 3% dos casos há plaquetopenia auto-imune (púrpura
trombocitopênica imune). A presença de anemia e plaquetopenia confere mal
prognostico para a doença.
No
esfregaço sanguíneo há presença de células com núcleo bizarro. Outro exame utilizado
é a imunofenotipagem, porque apesar dos linfócitos serem macroscopicamente
normais, eles são imaturos funcionalmente.
Podem
ser encontrados anormalidades das imunoglobulinas devido ao bloqueio de
maturação dos linfócitos B: hipoglobulinemia pode estar presente em 8% dos
casos na época do diagnostico e em 2/3 dos pacientes durante a evolução
eocasionam risco aumentado de infecção bacteriana. Pode haver aumento de LDH e
β2 microglobulina em 60% dos casos, assim como hiperuricemia (isso devido ao
tunover aumentado dos linfócitos).
Diagnóstico
A
punção de medula óssea não é essencial para o diagnóstico. Usualmente revela
celularidade normal ou aumentada com linfócitos contribuindo com mais de 30%
das células nucleadas.
A
biopsia de linfonodo revela apagamento da arquitetura do linfonodo, infiltrado
de linfócitos com aparência madura, pequenos, alguns prolifócitos e
paraimunoblastos.
Diferença entre LLC e
linfoma de pequenas células
Ambos têm a mesma aparência microscópica no linfonodo (ambos apresentam
infiltrado linfocitário). O que os diferencia é que na LLC há linfocitose
(>5.000), o que não esta presente no linfoma.
Diagnostico diferencial
O
diagnostico diferencial deve ser feito com situações que podem gerar
linfocitose como as infecções viróticas ou não: mononucleose, toxoplasmose.
Essas patologias geralmente tem curso clínico diferente e duram poucos dias e
semanas, com retorno espontâneo. Outra diferença é que não há alteração da
imunofenotipagem dos linfócitos.
Tratamento
Tem
bom prognostico, sendo que nem todos os pacientes requerem tratamento
especifico (alguns pacientes terão expectativa de vida normal). Exceto pelo
transplante de medula nenhum outro tratamento irá curar a doença.
O estadiamento da LLC é fundamental para
determinar a história natural da doença, orientando o hematologista quanto a
melhor estratégia terapêutica. O mais utilizado é o estadiamento de Rai:
ESTAGIO 0: observação e seguimento clinico, sem
tratamento especifico. Deve-se fazer hemograma trimestral. A estabilização
durante 1 ano é sinal de doença estável.
ESTAGIO I: radioterapia localizada sem quimioterapia
associada.
ESTAGIO III, IV OU EM
CASOS DE ANEMIA HEMOLÍTICA, PLAQUETOPENIA E SINTOMAS LIMITANTES: utilização de
agentes citotóxicos – análogos da purina (fludarabine, pentostatin); agentes
alquilantes (clorambucil, bendamustine); anticorpos monoclonais (rituximab,
alemtuzumab) – e medidas utilizadas para prevenir síndrome de lise tumoral como
a hidratação oral e o uso de alopurinol
300mg/dia (acompanhamento com dosagem de acido úrico, potássio e LDH).
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