terça-feira, 20 de novembro de 2012

Lupus Eritematoso Sistemico


Lúpus Eritematoso Sistêmico
Introdução

As doenças autoimunes são um tipo de desordem imunológica caracterizada pela diminuição da tolerância aos componentes do próprio organismo.
Para que uma doença seja caracterizada como autoimune três requisitos devem estar presentes:(1) presença de reação autoimune;(2) evidências de que esta reação não é secundária aos danos teciduais, como os resultantes de uma infecção;(3) a ausência de outra causa bem definida para a doença.
Diversos estímulos promovem a ativação de linfócitos auto-reativos. Os seguintes mecanismos são sugeridos para explicar a relação entre infecções e autoimunidade: Up-regulation da expressão de co-estimuladores em células apresentadoras de antígeno,mimetismo molecular,as infecções podem causar dano tecidual e liberação de antígenos próprios que sofrem alteração estrutural e ativam células T.

Etiologia

O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica, autoimune, que apresenta grande variação de etiopatogenia, manifestações clínico-laboratoriais e prognósticos. De modo geral, há predomínio de acometimento cutâneo e articular e alterações imunológicas com formação excessiva de múltiplos auto-anticorpos.      
Sua etiologia ainda não está completamente elucidada, sendo provavelmente multifatorial e variável para diferentes indivíduos. Acredita-se que seja necessária a predisposição genética interagindo com fatores hormonais, ambientais e infecciosos, que levem à quebra da tolerância imunológica com formação de auto-anticorpos contra antígenos diversos. Foram identificados antígenos contra uma gama de componentes nucleares e citoplasmáticos que não são específicos nem para órgãos nem para a espécie. Além disso, um terceiro grupo de anticorpos é direcionado contra antígenos da superfície celular das células do sangue. Estudos de relação causal têm identificado como desencadeantes a infecção pelo vírus Epstein Barr, a exposição à radiação ultravioleta e contextos de variação hormonal como menarca e gravidez, por exemplo. Alguns antígenos leucocitários humanos (HLA) se associam a risco aumentado de LES. Há maior risco de produção de alguns auto-anticorpos na presença dos alelos DQB1 e DQA1. A quebra da tolerância no LES deve envolver mecanismos como exposição de antígenos nucleares e sua apresentação a linfócitos que desencadeiam ativação de clones autorreativos, particularmente da resposta humoral, redução da depuração de imunocomplexos e de restos celulares provenientes de apoptose e diminuição da atividade de linfócitos supressores. A prática clínica identifica com grande freqüência o início do quadro ou sua exacerbação intimamente relacionada a grandes perdas e outros tipos de estresse emocional, cujos mecanismos envolvem inter-relações do sistema neuropsíquico e imunoendócrino ainda pouco esclarecidos.

Epidemiologia

Incidência:
É muito variável:
-   Varia de 3,7 a 5,5 por 100.000 habitantes;
-   Em Natal (RN), identificou-se incidência de 8,7/100.000 habitantes no ano de 2000, o que sugere a associação da exposição solar com o LES. A radiação ultravioleta, que comumente exacerba manifestações cutâneas do LES, também pode ter um papel no seu desencadeamento.
-   Prevalência
O LES é uma doença de distribuição universal, cuja prevalência tem aumentado nos últimos anos, provavelmente, em virtude do aprimoramento nas técnicas de diagnóstico, com maior precocidade na identificação e aumento da sobrevida.
-   Na população em geral, é de 40-50 casos por 100.000 pessoas;
-   Há uma preponderância na população feminina, na proporção de 9:1;
-   Nos EUA, é mais freqüente em mulheres e em negros (chance de 1:250 em mulheres negras americanas) e, na faixa etária de 15 a 40 anos;
-   A associação familiar é comum e a coincidência de gêmeos idênticos é de 30%.

Patogenia do Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES)

A patogenia do LES está relacionada com os seguintes processos:
-   Defeito na remoção de células apoptóticas, o que permite a estimulação do sistema imunológico por apresentação de autoantígenos.
-   Perda da autolerância imunológica, condição em que o sistema imunológico do indivíduo passa a responder a antígenos próprios.
-   Ativação policlonal de células B dependente de células T auxiliares antígeno- específicas que passam a produzir anticorpos que lesionam o tecido.
-   Produção de auto-anticorpos, particularmente anticorpos antinucleares (ANAS). Os ANAS são direcionados contra diversos antígenos nucleares e são agrupados em quatro categorias: anticorpos contra histonas, anticorpos contra DNA, anticorpos contra proteína não histonas ligadas ao RNA, e anticorpos contra antígenos nucleolares. Os auto-anticorpos tem alta especificidade e afinidade e pertencem a classe IgG, eles promovem a lesão tecidual que fornece mais auto-antigenos, perpetuando a resposta auto-imune.
-   Diminuição da remoção de imunocomplexos: a falta do complemento pode prejudicar a remoção de imunocomplexos circulantes e de células apoptóticas pelo sistema fagocitário.
A maior parte das lesões viscerais no LES decorre da formação de imunocomplexos durante a Hipersensibilidade do tipo III. Neste tipo de hipersensibilidade há formação de complexos antígeno-anticorpo na circulação, caso estes não sejam devidamente removidos podem se depositar em diversos locais do corpo: glomérulos renais, articulações, pele, coração, superfícies serosas e pequenos vasos sanguíneos.
Uma vez depósitos nos tecidos, os complexos iniciam uma reação inflamatória por dois mecanismos: (1) ativação da cascata do complemento- pela produção de fatores quimiotáticos, que direcionam a migração de leucócitos e monócitos e liberação de anafilotoxinas, que aumentam a permeabilidade vascular; e (2) ativação de neutrófilos e macrófagos por meio dos receptores Fc.
Os imunocomplexos podem promover também a agregação plaquetária o que amplifica o processo inflamatório e inicia a formação de microtrombos. A lesão inflamatória decorrente é denominada vasculite.

Sinais clínicos:

As lesões mais freqüentes são de natureza inflamatória e devem-se à deposição ou formação in situ de imunocomplexos em tecidos, seguidas de ativação do complemento. O padrão inicial se caracteriza por sintomas inespecíficos como mal-estar, fadiga,febre baixa, perda de peso, linfadenomegalia. A composição do quadro pode variar bastante de um paciente para outro. Pode acometer vários órgãos de forma cíclica ou persistente, pode ser de forma aguda ou crônica, com períodos de remissão e exacerbação.

Comprometimentos:                                                                                                

1)      Cutâneo: mais comum eritema malar (característica lesão em asa de borboleta na face), fortemente associada à fotossenssibilidade; Lesões agudas são eritematosas, maculares, papulares ou mesmo bolhosas, predominantes em áreas expostas ao sol. Lesões discóides, uma forma de lúpus cutâneo crônico, iniciam-se por pápulas ou placas eritematosas que se tornam espessadas, aderidas, com centro hipopigmentado. Alopecia.
2)      Articular: Cerca de 90% dos pacientes se apresentam com dor articular, alguns com artrite (mãos, punhos e pés).
3)      Hematológico: A anemia hemolítica é um critério diagnóstico. Ao longo da evolução mais da metade dos casos cursarão com leucopenia e linfopenia.
4)      Renal: Glomerulonefrite de intensidade e gravidade variadas, causada pela deposição de imunocomplexos nos glomérulos renais. Proteinúria, cilindrúria anormal ou pelo aumento dos níveis séricos de creatinina.
5)      Neurológico: tem apresentação variável sendo classificada pelo Colégio Americano de Reumatologia em dois tipos de manifestações neuropsiquiátricas: Comprometimento do SNC e Comprometimento do SNP
6)      Serosas: Dor torácica, derrame pleural e alterações geralmente assintomáticas no pericárdio.
7)      Pulmonar: A pneumonite lúpica se manifesta por dispneia, tosse que pode ser produtiva, febre, eventualmente cianose. A radiografia mostra infiltrado alveolar difuso. A hemorragia alveolar é extremamente grave e pode ser maciça, mas é rara.
8)      Cardíaco: Pode ocorrer endocardite, com insuficiência da valva mitral. O diagnóstico clínico de miocardite é incomum, pode evoluir para insificiência cardíaca. A aterosclerose é a causa mais frequente de comprometimento coronário, que tem sido relacionada à crônica atividade inflamatória de pacientes lúpicos.
9)      Vascular: As vasculites podem acometer vasos de diferentes calibres, principalmente os pequenos, podendo causar manifestações diversas relativas a isquemia e necrose tecidual em determinados órgãos, sobretudo, mucosa oral ou nasal e na pele, mais na extremidade dos dedos
10)  Digestório: um quinto dos pacientes apresenta hepatomegalia ou esplenomegalia. Há quadros que de abdome agudo em deve se lembrar de vasculite mesentérica. Evolução para peritonite crônica é muito rara. Pancreatite aguda pode ocorrer em raros casos. Dor abdominal, náuseas e vômitos são mais frequentemente observados como efeitos adversos da terapia medicamentosa.
11)  Ocular: A conjuntivite e a vasculite retininana são os acometimentos mais freqüentes.
12)  Endócrino: Irregularidades no ciclo menstrual podem ocorrer em períodos de inflamação sistêmica, mas a fertilidade não está alterada. A menopausa precoce é descrita em pacientes com LES, possivelmente relacionada à presença de anticorpos contra-antígenos ovarianos.
13)  Muscular: redução de massa magra em pacientes com LES, decorrente do descondicionamento físico e da corticoterapia.

Diagnóstico:

São de grande utilidade os critérios do Colégio Americano de Reumatologia para a classificação do LES que exigem a presença de quatro ou mais itens de uma lista de 11, apresentam sensibilidade e especificidade em torno de 96% e tiveram sua última modificação em 1997.
1. Eritema malar
2. Lesão discóide
3. Fotossensibilidade: exantema (erupção) cutâneo decorrente de exposição à luz solar
4. Úlceras orais/nasais: usualmente são indolores.
5. Artrite: caracterizadas por dor e edema ou derrame articular
6. Serosite: pleuris (atrito pleural auscultado por médico ou imagem de derrame pleural) ou pericardite (atrito pericárdico ou imagem de derrame pericárdico).
7. Comprometimento renal: proteinúria persistente ou cilindrúria anormal.
8. Alterações neurológicas: convulsão ou psicose
9. Alterações hematológicas: anemia hemolítica ou leucopenia ou linfopenia ou plaquetopenia.
10. Alterações imunológicas: Ac anti-DNA nativo ou anti-Sm ou Ac antifosfolípide baseado em: a) níveis anormais de IgG ou IgM anticardiolipina b) teste positivo para anticoagulante lúpico ou teste falso-positivo para sífilis, por no mínimo seis meses.
11. Anticorpos antinucleares: título anormal de Ac antinuclear por imunofluorescência indireta.
FATORES ANTINUCLEARES (FAN): Método: Imunofluorescência indireta.  Indicação: teste de triagem para doenças auto-imunes e lúpus eritematoso sistêmico (LES)
Exames complementares: hemograma, creatinina, coagulograma, urina tipo I, radiografia do tórax, dosagem séricas de proteínas do sistema complemento.

Tratamento

Informação, bem como o apoio psicológico ao paciente e familiares, de forma que os pacientes possam aderir ao tratamento e a grande maioria terá boa evolução e qualidade de vida.
O tratamento se inicia com medidas gerais.
A atividade física (controle de sintomas depressivos, redução de fadiga, dores difusas, distúrbio do sono e melhora do condicionamento físico).
A alimentação equilibrada, que garante aporte proteico e cálcio, que evita excessos no consumo de sal, carboidratos e lipídios.
A proteção contra luz solar e outras fontes de irradiação ultravioleta (UV), é capaz de prevenir ativação da doença.

Tratamento Medicamentoso                                                                             

Antimaláricos: agem como poupador de corticoide e também colabora no controle da dislipidemia e na redução da hipercoagulabilidade, comumente presente.
AINH: habitualmente são efetivos no controle de manifestações articulares leves e serosites.
Corticosteroides                                   
Essa medicação tem diversas indicações no tratamento da LES e deve ser administrada em dose baixa para controle da doença,
Talidomida: Indicada para lesões cutâneas não responsivas ao tratamento usual.
Imunoglobulina intravenosa: Indicada para plaquetopenia grave.
Anticoagulantes
Imunossupressores

Prognóstico

Sinais clínicos podem prover informações prognósticas sobre envolvimento geral e de órgãos principais.
Nas últimas décadas a sobrevida no LES aumentou muito – sendo por volta de 85% em dez anos, mas variam de acordo com condições sócio-econômicas e outros fatores.
A mortalidade tem padrão bimodal – nos primeiros anos ocorre principalmente por infecção, seguida de grave atividade renal ou em SNC após vários anos, por doenças cardiovasculares associadas a arteriosclerose, relacionada parcialmente à corticoterapia, mas também à inflamação crônica.

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